Monday, March 08, 2010

Prisões ambulantes

De casa para o trabalho, do trabalho para a faculdade, da faculdade para a casa, passando sempre pelas mesmas ruas... A rotina traça nossos caminhos como se não existissem outros para chegar aos mesmos lugares. Normalmente nos sentimos pressionados a fazer os trajetos mais rápidos, aqueles que já conhecemos. E assim semanas, meses, anos se passam na repetição das mesmas rotas, numa espécie de prisão ambulante.

A pressa da lógica do “tempo é dinheiro” traça previamente nossos caminhos. A rotina exige que estejamos em determinadas horas em determinados lugares, todos os dias. Nossos deslocamentos precisam durar x minutos, para que não nos atrasemos. E a maneira mais fácil de fazer isso é continuar a repetir as rotas e os horários. A gente deixa de fazer o percurso, o percurso é feito pelo nosso piloto automático.

A violência se soma ao nosso medo do desconhecido para reforçar as grades da prisão ambulante. As ruas que não conhecemos podem ser perigosas, o perigo pode estar em qualquer lugar, melhor continuarmos nos caminhos de sempre. E assim, a rotina caminha em direção à claustrofobia, transformando o mundo em um corredor estreito e longo, pelo qual sempre caminhamos.

Por isso a conversa com o artista Julio Callado me acendeu tantas luzes. Callado viajou do Rio ao Recife de ônibus, parando em cidades pouco turísticas sem nenhum roteiro prévio, buscando uma trajetória à deriva, oposta a nossa experiência rotineira de estar sempre querendo chegar a algum lugar. O registro em vídeo da sua experiência está exposto na Galeria Massangana, da Fundaj Casa Forte.

Nas cidades pelo caminho, seus próprios habitantes diziam que não havia nada para ver lá. Mas Callado acredita que é possível viajar no próprio bairro, até mesmo na própria casa. Basta se libertar dos códigos que normalmente amortecem os sentidos dos caminhos, como a pressa, a segurança, as rotas pré-definidas.

Eu fiquei com uma vontade danada de fazer isso no meu bairro, que tem fama de perigoso. Sair da rotina é arriscado, mas se deixar aprisionar por ela envolve um risco ainda maior.

Monday, January 18, 2010

Um sopro.

Um poema se desenha com leveza
cada traço flutuando na incerteza
de caber na moldura que o abriga.

Com palavras escondidas na cabeça
a caneta corre em busca de clareza
e precisa cuidar bem do que ilumina.

Muita luz só pode afugentar a presa
muita força pode ser bem mais fraqueza
ao soprar as bolhas que farão a rima.