Wednesday, December 26, 2007

Reticencias da retina

10 dias sem postar e o blog vai acumulando as teias de aranha que fazem o numero de visitas despencar... Isso nao e bom, afinal eu quero ve-lo crescendo firme, forte e sadio... Nao e facil conciliar demandas turisticas e etilicas com atualizacoes frequentes, mas...


Fontana de Trevi, em Roma. Sou mais a antiga fonte da Praca do Derby!


Coliseu, tambem em Roma, local do teatro e dos Ultimate Fightings da antiguidade.


Alhambra, em Granada, um palacio construido pelos arabes no tempo em que ocuparam a Espanha, bem diferente dos outros palacios e castelos europeus.


Jardim na Alhambra, em Granada.


Esse tomou uma manguaca tao grande que ta vomitando ate hoje...

Saturday, December 15, 2007

Versos Sobrios

Quanto alcool na procura pela musa!
Quanta gente descontente se nao usa
aditivos para a mente colorir.
Preto e branco e a vida desses tantos
So melhora na hora de se divertir

Quem cria desconfia que o talento
se solta com a escolta dum veneno
e gera obra onde sobra a tal magia;
Ruim e quando o encanto so se da
aos que vagam com a mesma bengala do artista

Saturday, December 08, 2007

Os problemas da tranquilidade

Nao gosto de fazer as coisas com pressa. Nao vejo o sentido em elevar os niveis de estresse e nervosismo para terminar as tarefas uns poucos minutos antes. Alguns chamam isso de lerdeza. Eu chamo de tranquilidade, e tenho ao meu lado autoridades do calibre de Dorival Caymmi e Dalai Lama confirmando a sabedoria da minha atitude.

Pois bem, o que se faz num domingo de sol quando se esta ao lado do Vaticano? Ver o discurso do Papa, e claro. Chego na praca redonda, vejo aquela multidao e ouco aquela voz profunda, de todas as direcoes. Mas cade o diabo do Papa? Olho em todas as direcoes, mas nao encontro nem sinal da autoridade eclesiastica. Bom, daqui a pouco eu acho, o Papa vai surgir na minha frente como uma revelacao espiritual. Ouco o seu Bento agradecer aos falantes de lingua espanhola, portuguesa, as caravanas deliram, parece um show pop, mas sem a histeria das tietes.Finalmente eu noto que o povo no centro da praca esta olhando em uma direcao que nao e a do telao, onde aparecia as legendas do discurso. Vou ao centro, olho na mesma direcao do olhar do povo, e ei-lo! O Papa em toda a sua magnitude, percebida como um binoculo ao contrario, devido a grande distancia entre a praca e a janela papal. Sem problema, com a ajuda do zoom da camera, vou tirar a primeira foto de celebridade da minha viagem.

Foi ai que descobri porque os Paparazzi nao sao pessoas tranquilas, o mesmo valendo para fotografos jornalisticos. Saquei a camera, e nesse exato instante o papa encerrou o discurso! Enquanto eu tirava a camera da capa alguem retirava o tapete catolico da janela, de modo que quando tirei a foto, nao havia nenhum sinal da presenca do Papa, e ele estava ali 30 segundos antes.

Publico a foto sabendo que pessoas religiosas enxergam alem da capacidade do olho. Tente voltar a foto 30 segundos com o controle remoto espiritual, e voce tera uma nitida imagem do Papa, como eu tive. Acredite em mim, eu tenho credito na praca.


Bem-aventurados sao aqueles cuja fe nao depende dos olhos.

Sunday, December 02, 2007

A cegueira da visao

Artes visuais nao me dizem muita coisa. Pinturas, esculturas, arquitetura, tudo isso nao me fascina. Em museus, sao raras as vezes em que nao tenho que driblar o tedio. Ouvir e ler as explicacoes sobre os quadros me estimulam mais do que olha-los.

Tenho visto muito quadros e esculturas famosas nessa viagem. Minha reacao padrao a maior parte e um "que bonito!" desempolgado. Fico imaginando como Paulo Mineiro - que tem apetite para artes visuais equivalente ao meu para artes escritas e sonoras - reagiria. Provavelmente derreteria em extase contemplativo.

Sei que posso, investindo algum tempo e energia, me divertir mais com meus olhos miopes. Apreciar arte e um prazer que pode ser cultivado, como tomar vinho. Mas existem dezenas de prazeres que podem ser cultivados. Porque deveria eu escolher esses dois? Nunca fiz questao de fazer parte do sofisticado grupo de apreciadores de artes e vinho - razao que leva a maior parte dos que nao tem gosto natural pela coisa a fazer o esforco de plantar a semente em solo inospito.

No momento venho fazendo o esforco porque estou tendo a oportunidade de ver todas essas maravilhas in loco - seria um crime nao conhece-las, e quase uma obrigacao de turista. E tudo muito bonito. Mas as estorias do Neil Gaiman me divertem bem mais do que os quadros do Da Vinci.

Wednesday, November 28, 2007

Visualizando as andancas


Relogio Astronomico, na antiga Prefeitura de Praga.


Jesus na ponte Charles, tambem em Praga.


O capeta na cerveja Belga, em Budapeste. Reparem na pose intelectual do Tinhoso, a mao no queixo, o ar de planejamentos maquiavelicos...



Veneza, a Recife Italiana. Meus conterraneos que me desculpem, amo minha cidade, mas a rival comedora de pizza e bem mais bonita...


Segurando a Torre de Pisa, gracas a vitamina de banana. Creditos a Pedro Cuomo, que tirou a foto mais elogiada da minha camera.

Friday, November 23, 2007

Plantas de plastico

Melancolia e quase um pecado nos dias atuais. Se voce passar dois minutos em silencio, sao grandes as chances de ouvir "o que ha de errado com voce?". Principalmente se voce for jovem, porque se espera do jovem uma atitude Wild On perante a vida - ha melancolia o bastante esperando por ele na velhice.

Alegria e a melhor coisa que existe, cantava Vinicius, com toda razao. Mas a obrigacao de estar alegre o tempo todo e bem triste, e dessa tristeza nao sai samba, so a impressao de que alegrias fabricadas em serie sao como plantas de plastico: pode ate ser bonito, dar ibope, mas nao ha vida de verdade, so uma imitacao.

A felicidade precisa de vento soprando, tambem cantou o Poetinha. E natural buscar os pontos mais ventilados no nosso caminho, mas a "alegria" de que falo aqui e como um ventilador conectado a uma esteira com uma pessoa em cima suando horrores para produzir o vento - sem sair do canto.

A lei do contraste faz a melancolia necessaria para melhor apreciar a alegria, mas nao se trata de buscar uma ou outra - se trata de se livrar do esforco em parecer feliz ou triste. Afinal, nao faz sentido aguar plantas de plastico.


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Apreco pelo Silencio

Sunday, November 18, 2007

Sem palavras


Budapeste, vista do alto da montanha do castelo. As construcoes da cidade sao de uma opulencia impressionante, e ao mesmo tempo varios carros bem fubecas trafegam pelas ruas, contraste do Imperio Austro-Hungaro x Periodo pos-guerra/comunismo.



Um museu no "Quarteirao dos Herois", a parte de Budapeste que mais gostei.



Parlamento em Viena, uma das cidades mais chinfrosas, em termos da magnitude das construcoes. Aqui ja nao se ve tantos carros fubecas...


Na Noruega vi neve, mas acho que ainda nao tinha enfrentado temperaturas abaixo de zero. Sente o drama e o trabalho que e sair de carro no Inverno, limpar toda a neve em cima e embaixo do veiculo, alem das ruas derrapantes... Pra que, se o transporte publico te leva para todo lugar, com seguranca?


Os Austriacos sabem o quanto a musica classica pode ser inspiradora. Por isso montaram um banheiro onde voce pode fazer sua arte ouvindo o melhor das sinfonias Europeias.

Saturday, November 10, 2007

Primeira a esquerda depois do desencanto

Estive no Museu do Comunismo, em Praga. Bem facil de achar, ao lado de uma McDonalds e um cassino. Esperava encontrar uma visao proxima de "uma ideia nobre que nao funcionou economicamente". Longe disso. Marx e descrito como um romantico boemio de fantasias apocalipticas e teorias obsoletas, Lenin como um revolucionario cuja unica motivacao era vingar o assassinato do irmao por homens do Czar, e o Comunismo como um periodo nefasto da historia Tcheca que, gracas a Deus (ou a God), acabou. Igualdade social, saude, educacao, emprego e alimento para todos, os pontos positivos do Comunismo sao retratados como resultado da maquina de propaganda do Estado Sovietico, tambem ocupada em esconder a truculencia repressora do regime e endemonizar os Estados Unidos.

Muita gente se incomoda com o fato de existir tanta gente tentando sobreviver em condicoes sub-humanas. Essas pessoas tendem a ter simpatia pela Esquerda. A ideia de Esquerda = combate as injusticas sociais e Direita = manutencao dos privilegios esta introjetada na cabeca de muitos. E um enorme desprazer, portanto, quando se descobre que a Esquerda, no poder, nao age de acordo com os nobres ideais que a identificam. A desilusao pode ser tao grande a ponto de causar uma inversao nas conviccoes politicas, ou ate mesmo uma desistencia em tentar entender e se posicionar no jogo sujo.

Hoje em dia, Esquerda e Direita sao termos que nao dizem muito - A Direita tem discurso social, a Esquerda tem compromisso com os bancos. O Liberalismo e visto como "o jeito certo" de gerir a economia e o Comunismo virou historia - um tanto sombria para os que o viveram de fato, um tanto dourada para os que o imaginam como uma alternativa de mundo melhor, mais justo. Sonhos dourados, realidade sombria, o grande erro do Comunismo foi nao ter investido pesado na industria cultural.

Wednesday, October 31, 2007

Eu sou o verdadeiro Sub-Zero brasileiro!

Dando sequencia a minha inatividade textual, aproveito o aparecimento de provas incontestaveis para fazer uma importante reivindicacao: eu sou o verdadeiro Sub-Zero brasileiro! Esquecam Lindomar e sua voadora fajuta, que todo mundo que ja jogou Mortal Kombat sabe que nao e exclusividade do Sub-Zero, ja que o Scorpion tambem faz igual, e que qualquer faixa amarela de Tae-Kwen-Do pode fazer parecido. Nao, meus caros, o que torna Sub-Zero unico na historia da carnificinia eletronica e que ele e capaz de congelar seus oponentes com seu sopro. E eu tambem sou capaz de fazer o mesmo! Apos um exaustivo treinamento nas geleiras norueguesas, eu pude aprender a milenar tecnica do sopro congelante, atraves dos ensinamentos de um sabio senhor cuja identidade secreta eu revelarei. Sem mais delongas, apresento as provas inquestionaveis do fato:


Bernardo, o Sub-Zero brasileiro, dispara seu sopro congelante...


...E vejam so o que acontece com o pobre carro. FATALITY!


Este e o sabio senhor que me ensinou a tecnica. Obrigado, Mestre!

Thursday, October 25, 2007

Estoria de Pescador

Quando imaginava uma pescaria, tedio era a primeira coisa que me vinha a cabeca. Qual a graca de segurar uma linha por horas, esperando o vacilo do peixe? Por conta disso, fui pescar pela primeira vez duas semanas atras, para confirmar o equivoco de minhas ideias sobre coisas que nunca fiz.

Esperar pela fisgada e legal porque ela pode acontecer a qualquer momento, o que te leva a ficar sempre alerta. Qualquer mudanca no peso da linha eu ja pensava em peixe, mas era so uma posicao diferente da linha no mar. Quando o anzol e mordido nao ha duvidas, embora o peixe, se nao estiver bem fisgado, possa escapar enquanto se puxa o carretel. Mas e claro que isso nao acontece com inciantes esforcados como eu. Na primeira fisgada, pesquei 5 coldfishes, garantindo o jantar do dia, porque a experiencia so se completa quando se come o que se pesca. Valeu a pena sentir os dedos do pe tao congelados a ponto de achar que iam quebrar feito vidro se eu pisasse com forca. Minha querida Noruega, e a mim que teu mar se entrega!


Vamos la, peixinho, colabora...


Bingo! Meu forte e a pesca, e eu so vim saber agora!

Friday, October 19, 2007

Silencio e desacordo

Uma voz que se cala de repente
O silencio ocupando o lugar da cancao
Como um vulcao em extincao
lutando para expelir a lava quente
vendo o gelo inverter a direcao

Os pocos escondidos pela mente
As quedas onde nao se atinge o chao
Sonhos de longa duracao
Escadas construidas lentamente
Acordos entre o louco e o sao

Quando a musica tira o laco do presente
Perguntando se ainda se sabe como sao
os mergulhos na cratera incandescente
E preciso ter cuidado para nao
despencar no desacordo novamente.

Wednesday, October 17, 2007

Subestimando a capacidade alheia

Escrever partindo da premissa de que o seu leitor e uma anta pode ser muito frustrante ambas as partes, mas e o que acontece em diversos meios de comunicacao.
O Blog O Leitor, esse idiota oferece a visao de um jornalista cuja experiencia indica que a idiotice pressuposta e muito maior do que a real. Vale a pena dar uma olhada, especialmente em dois textos: E por que nao instigar?, onde ele trata dos motivos da classificacao e dos beneficios em abandona-la, e Quem e O Leitor, de que tantos colegas falam, um perfil dessa criatura a quem boa parte da imprensa se dirige.

Saturday, October 13, 2007

Essa coluna vai mudar sua vida

Traducao de uma coluna da revista Weekend do jornal The Guardian, escrita por Oliver Bukeman, em 29/09/07.

Outro dia, me deparei com uma pesquisa assustadora, capaz de parar o coracao, e desde entao, como o velho marinheiro, venho me sentindo forcado a sair por ai contando para os outros, como se isso de alguma maneira aliviasse a dor. Agora e sua vez de ouvir. Todos nos sabemos, e claro, que o tempo parece acelerar quando envelhecemos, mas de acordo com estudos da Universidade de Cincinnati nos anos 70, esse efeito e tao intenso que, se voce hoje tem 20 anos, voce ja esta na metade da sua vida, em termos da sua experiencia subjetiva de como o tempo passa, mesmo que voce viva 80 anos. E se voce tem 40 anos, novamente assumindo que vai viver ate 80, 71% de sua vida ja se foi. Basicamente, se voce tem mais de 30, ja esta com um pe na cova. Tenha um otimo fim de semana!

Envelhecer nao e o unico fator que modifica nossa percepcao do tempo. Uma semana de ferias em um pais estranho parece, em retrospcto, ter durado muito mais do que uma semana comum de trabalho, que passa num piscar de olhos. Por outro lado, um dia desespedoramente chato parece alongar infinitamente. "Ponha sua mao numa panela quente por um minuto, e isso parece uma hora", disse Einstein. "Sente com uma garota bonita por uma hora, e isso parece um minuto. Isso e relatividade."

Entao podemos nos, trintoes-geriatricos, e outros, encontrar uma maneira de desacelerar o tempo, alongar nossas horas mais prazerosas, sem - como Dumbar em "Catch 22", desesperado para prolongar a propria vida - tentar nos manter entediados de proposito? Steve Taylor, que escreve sobre psicologia, oferece alguma ajuga em seu livro: Criando tempo: Porque o tempo parece passar em diferentes velocidades e como controlar isso. Ele aceita, parcialmente, que o tempo parece acelerar simplesmente porque cada novo ano de nossas vidas e uma fracao menor do total: se voce tem 10 anos, cada ano anterior foi 10% de sua vida inteira; se voce tem 70, cada ano foi apenas 1,4%. Mas uma ideia mais interessante, proposta primeiro pelo "vovo da psicologia" Willian James, e comprovada por experimentos, e que o tempo passa mais devagar quando temos que absorver mais informacao. Isso explica porque a ida a um lugar novo parece demorar mais do que a volta, e porque a semana de ferias parece mais longa do que a de trabalho. Uma solucao obvia, entao, e buscar novidades, e quebrar a rotina. Pessoas que viajam em aventura, escreve Taylor, reportam passeios que parecem mais longos do que as ferias daqueles que escolhem a regularidade e inatividade de uma semana na praia.

Espere um pouco: o tempo nao parece voar quando voce esta desfrutando os momentos? Sim, mas ha uma confusao aqui, entre a percepcao do tempo na nossa memoria e o momento em si. Na verdade, nao queremos sentir as horas passando devagar: o nome disso e tedio. Nos queremos olhar para tras, para o ano passado, digamos, e sentir que ele nao passou rapido demais. Nossos momentos mais felizes sao aqueles em que paramos de pensar na passagem do tempo completamente, mas depois lembramos deles com tendo durado um tempo deliciosamente longo. Esportes radicais, meditacao, qualquer atividade de alta concentracao vai produzir esse efeito. Mas sentar numa sala escura, remoendo as implicacoes da pesquisa de Cincinnati, nao vai, portando vou tentar parar com isso.

Thursday, October 04, 2007

Bomba Balanca Confianca

Um dos pontos altos dessa minha semana em Londres era a visita a sede da BBC, local onde Juliana Rondom trabalha na recepcao, para desgosto de algumas celebridades britanicas que nao sao reconhecidas pela gringa brasileira. Na minha viagem de Brighton a Londres, descobri que o peso da minha bagagem estava intransportavel. Precisava me livrar de algumas das minhas tralhas, e Juliana me salvou de pagar uma fortuna para enviar os itens para o Brasil, se oferecendo para levar o excesso a patria amada no fim do ano. Combinamos que eu levasse as sacolas cheias de revistas, livros e roupas para a emissora inglesa, para encacapar, numa so tacada, as visitas e as quinquilharias.

Chegando la, despejei a carga num cantinho ao lado da recepcao, com a garantia de Juliana que meus pertences estavam seguros naquele local. O que eu nao podia imaginar e que o local estaria em risco por conta dos meus pertences. Ao sair da recepcao para o intervalo do almoco, Juliana esqueceu de informar ao seu colega sobre sobre a natureza inofensiva da minha bagagem. Quando o cara viu aquele monte de sacolas sem dono, o botao vermelho da paranoia-seguranca comecou a piscar enquanto a sirene de "Kill Bill" zunia na cabeca do cidadao, que chamou a seguranca do predio para lidar com o possivel desastre. Os homens vieram com detectores anti-bomba que seriam ativados caso houvesse um barbeador eletrico no meio da bagunca, e ai eles teriam que evacuar o predio por conta da iminente explosao. Programas seriam cancelados com enorme prejuizo para e emissora, talvez o emprego de Juliana tambem explodiria pelo custoso alarme falso. Tudo isso aconteceu enquanto eu e e ela caminhavamos tranquilamente pelos estudios da BBC.

Felizmente Juliana so teve que ouvir um sermao do senhor da seguranca sobre a possibilidade do panico geral, e eu pude reaver minhas sacolas sem maiores problemas. Passado o susto, assisti num dos estudios um programa chamado Golden Ball. E um jogo com premio em dinheiro, onde os participantes recebem bolas douradas com diferentes valores, e precisam descobrir quem esta mentindo para seguir em diante. A cada rodada eles votam em um jogador para abandonar a brincadeira, ate que so restem dois dos quatro no final, quando ocorre uma etapa curiosa: os finalistas tem que escolher entre "roubar" ou "dividir" sem revelar a escolha para o outro. Se os dois escolhem "dividir", cada um recebe metade da grana acumulada. Se um escolhe "dividir" e o outro "roubar", o que roubou leva toda a grana, um verdadeiro incentivo a desonestidade. E se os dois escolhem "roubar", ninguem recebe um centavo. Os finalistas eram uma mulher e um cara, e a lady tinha passado o jogo todo dizendo que queria encontrar alguem confiavel para dividir a grana, que ela so queria ir pra casa com algum dinheiro... E o cara concordando, que pra ele tava tranquilo dividir a grana tambem. No ultimo momento, a malandrona escolheu "roubar" e levou toda a bufunfa, o cara acreditou, como todo mundo na plateia, que os dois iam dividir o dim-dim. A cara de odio e decepcao do cara quando isso aconteceu deu pena, uma senhora do meu lado disse que teria batido na madame fuleiragem, que levou pra casa 18.000 libras. "Minha honra permanece intacta", disse o cara, tentando se consolar pelo bolso que permanecia vazio. Que joguinho pilantroso!

Friday, September 28, 2007

Mais fotos

Uma das vantagens das fotos e que elas me permitem atualizar o blog sem precisar de muito esforco criativo. To nos meus ultimos dias em Brighton, e nao me parece o momento adequado para dedicar tempo a escrita. Em breve, os textos retornam ao seu lugar.


Duas atracoes turisticas de Brighton: A igreja de Saint Peter e os onibus de dois andares. De vez em quando vejo uns adolescentes nos ultimos bancos do segundo andar, gritando, ouvindo hip-hop e batendo na janela, e me pergunto se os vejo da mesma forma que eu era visto quando perturbava o sossego nos transportes coletivos alguns anos atras.


Uma outra foto do Royal Pavillion, porque a ultima nao deu uma ideia exata da majestosa magnitude da construcao.


Orla de Brighton, com onibus de passeio e uma construcao no mar cujo nome me escapa.
E um passaro no centro, como tinha prometido na foto de algumas semanas atras.


Do lado esquerdo, quatro espanholas; do lado direito, uma austriaca. No meio delas, um brasileiro se perguntando sobre a melhor maneira de admnistrar essa dificilima situacao.

Sunday, September 16, 2007

Brincadeira e personagem

O controle da respiracao. Quando crianca, ele gostava de brincar com as diversas maneiras do ar entrar pelos pulmoes. Tudo comecou com as aulas de natacao, e as competicoes para ver quem passava mais tempo debaixo d'agua. Era otimo se desconectar do mundo por alguns instantes, flutuando na agua e nos pensamentos que comecavam lentos e iam acelerando, a medida que o tempo sugava o oxigenio dos pulmoes. A calmaria despejada pela urgencia de ar, contagens ate 10 em menos de dois segundos, diversas vezes, ate os musculos respiratorios comecarem suas contracoes involuntarias, uma vez, duas vezes, tres vezes, e o corpo nao podia esperar mais um milesimo de segundo sequer para ser invadido pelo ar. E que ar! Nao ha inspiracao mais prazerosa do que aquela que espera o quanto pode para acontecer. Sentir o pulmao dilatando, como um saco plastico soprado com forca, e por alguns instantes nao ha mundo, nao ha mente, nao ha nada alem de ar penetrando pulmoes, produzindo um orgasmo respiratorio.

Na adolescencia, ele passou a brincar com os estados de espirito. Se podia controlar os pensamentos que por sua vez davam origem aos sentimentos, era possivel escolher o que sentir, ele lera num livro de auto-ajuda, e aquilo fez um sentido enorme. Comecou a brincar com a construcao da identidade, escolhendo caractersiticas que gostaria de incorporar atraves das escolhas do pensar/sentir, como se fosse um personagem de RPG. E durante algum tempo, ele era exatamente quem queria ser, e um monte de gente queria ser como ele, era o que ouvia de vez em quando, e aquilo trazia uma vaidade enorme. Se sempre se sentira diferente da maioria, a diferenca agora parecia ser superioridade, sentimento bem diferente do que experimentava ao ser escolhido por ultimo para os times da Educacao Fisica, poucos anos antes, mas que pareciam bem distantes dessa epoca dourada. Agora a sociabilidade e o intelecto funcionavam tao bem que a inaptidao nos esportes nao incomodava mais. Quando questionado se jogava bola, respondia que isso e coisa para atleta. "E voce e o que?" "Sou boemio!", afirmava risonho, fazendo os outros rirem junto com ele.

A vaidade trouxe outro tipo de brincadeira: provocar reacoes nas pessoas. Quando percebeu que conseguia ganhar a maior parte das discussoes, mesmo estando errado, ficou viciado no brinquedo. Logo descobriu que, as vezes, argumentos nao sao a melhor forma de levar os outros a agir ou sentir o esperado. Passou a brincar com a linguagem corporal, aprendendo o quanto um sorriso, um tom de voz, um toque ou um olhar podem produzir efeitos inalcancaveis pelo verbo.

Chegou um momento em que a brincadeira ficou seria. Parte do processo era antecipar as reacoes das pessoas, ler o que estava sendo comunicado nao-verbalmente. Um dia essa etapa passou a ter muito mais a ver com a imaginacao dele do que com a realidade, fenomeno tambem conhecido como paranoia. Comecava a desconstrucao do personagem, a identidade desejada dando lugar a uma nova pessoa, algumas caracteristicas desaparecendo, outras retornando. Era um processo do qual nao tinha controle, com o qual nao podia brincar, e que levou um longo tempo para se habituar com seus efeitos.

Hoje, ele sente saudades do seu personagem, e de vez em quando tenta reaver algumas de suas qualidades, quase sempre sem muito sucesso. Mas vive bem melhor agora, moderando a vaidade e as brincadeiras. Identidade, afinal, e muito mais descoberta do que construcao. E personagens funcionam melhor na ficcao.

Saturday, September 15, 2007

Mais massagens visuais


Orla de Brighton vista do Pier. Um otimo lugar para contemplar as belezas naturais e ambulantes da cidade.


Continuando a serie "construcoes chinfrosas", eis o Royal Pavillion, um dos pontos turisticos da cidade.


Quatro das "Seven Sisters", colinas na beira do mar, famosas por atrairem pessoas testando sua capacidade de voo pulando do alto em direcao ao desconhecido. Um lugar bonito para abandonar o mundo.


Palacio de Buckingham, lar da Familia Real. Bonito jardim, mas as orquideas Turca e Alema estao ofuscando a flora britanica...


Aniversario da princesa gaucha (um doce para quem advinhar quem e). Um espanhol em meio a brasileirada (outro doce pra quem adivinhar qual deles, nao tao obvio, mas com 50% de chances de acerto, desde que voce saiba quem sou eu).

Friday, September 07, 2007

Jesus me persegue

1998, carnaval em Itapuama, litoral de Pernambuco. Estavamos na beira da praia, ouvindo a gandaia das ondas no mar, quando um jovem se aproxima para nos entregar um panfleto evangelico. "Muito obrigado, eu sou satanista", declinei, no intuito de tornar a tarde mais divertida fazendo o crente espumar de raiva. Para minha surpresa, ele calmamente retrucou: "E mesmo? E o que voce acha que Sata tem para lhe oferecer?" Dai seguiu uma conversa amigavel, sobre os pros e contras do Senhor e do Tinhoso. Simpatizamos com o crente gente boa, e resolvemos aceitar o convite para dar uma olhada no culto a noite, na falta de algo melhor para fazer. O pastor era dos mais fanaticos, daqueles que bate recordes nos decibeis e na saliva emitida ao pronunciar o santo nome: "Jesus! Alguem aqui deseja entregar seu coracao a Jesus?" Levantei o braco, mas uma vez a procura de diversao. O pastor me chamou para junto dele, para comocao das senhoras da primeira fila, contentes de ver um rapaz tao moco trilhando o caminho da salvacao. Repeti a oracao junto com o pastor, intercalada com tragos de cigarro, fazendo um esforco sobre-humano para nao rir, enquanto via meus amigos gargalhando no fundo da tenda. Desde esse dia, meu coracao esta seguro nas maos do divino portador.

2007, fim do verao em Brighton, litoral da Inglaterra. Novamente ouvindo o barulho bravio das ondas que batem na beira do mar, fui abordado por membros do exercito de Jesus. Eu ja tinha lido o jornal deles, onde havia uma comparacao entre ficar bebado ou chapado, e "receber o Espirito Santo", com enorme vantagem para o ultimo. Disse a eles que achei essa abordagem inteligente, por aproximar duas coisas que, na cabeca de muitos, sao separadas por um abismo de distancia: Religiao e diversao. Passados alguns minutos de papo, eles perguntam:
"Voce gostaria que nos rezassemos para voce?"
"Eu vou receber o Espirito Santo?", perguntei, sorrindo ceticamente
"Talvez. Nao podemos garantir o que vai acontecer, mas certamente te fara bem".
Nao tendo nada a perder, e curioso ante a possibilidade da embriaguez divina, aceitei. Um deles colocou a mao na minha cabeca, outro pos a mao em meu peito, e comecaram a rezar, em ingles e em outra lingua estranha que eu supus ser Latim. Terminada a reza, eles perguntam:
"Como voce se sente?"
"Muito bem, mas eu estava me sentindo bem antes da reza, entao nao estou bem certo sobre os efeitos dela..."
Eles riram e continuaram a conversar, e eu percebi que tava querendo rir a toa, nao sei se pela reza ou por esse texto, que comecava a se desenhar na minha cabeca.

Saturday, September 01, 2007

Imagem nao e nada, mas mata a sede dos olhos

Seguem mais algumas fotos das minhas andancas pela Inglaterra. Legal estar descobrindo o prazer de fotografar, com tanta beleza em foco, podendo errar a vontade (benditas cameras digitais!), e sem medo de ser roubado.


Um castelo que a gente visitou no caminho para Liverpool. Eu achei enorme, mas uma brasileira mais rodada afirmou ja ter visto maiores e melhores. Fiquei imaginando o abismo entre as classes na idade media, quanto um aristocrata do castelo se sentia superior a gente comum?



Ja em Liverpool, a cidade dos Beatles. Esse e o club onde eles tocaram trocentas vezes antes de dominarem o mundo. Queen, The Who, Rolling Stones, Oasis, todos os gigantes passaram por aqui.


A reca da escola, num churrasco na mesma. A mulherada da esquerda e brasileira, as jovenzinhas do centro sao espanholas, e tem turco, brasileiros, espanhol e austriaco comprometendo a beleza da fotografia.


Essa e uma das inumeras faculdades de Oxford, existentes desde o seculo 13. Que chinfra, heim? Quase da para sentir no ar os seculos dedicados a transmissao de conhecimento.


Da tradicao para a modernidade, um grafite no centro de Brighton. Se isso nao e arte, o termo precisa de uma nova definicao.

Friday, August 24, 2007

Leis que pegam

Nao se pode mais fumar nos bares britanicos. Desde o dia primeiro de Julho que a fumaca esta proibida em ambientes fechados e publicos. Alguns bares tem uma area externa que permite a compulsiva combinacao alcool/nicotina. Mas na maioria o fumante tem que sair do recinto para dar suas tragadas, e nao pode faze-lo portando sua birita.

Todos os fumantes com quem conversei acham a lei absurda, ridicula, "onde ja se viu, beber sem poder fumar?". Mas a indignacao nao leva a transgressao: eles reclamam, mas cumprem a norma direitinho. Nao sei qual e a punicao para quem infringir a norma, mas sei que ninguem acendendo um cigarro dentro do bar ficara impune.

Lembro de uma estoria contada pelo meu pai, da epoca que tentaram proibir o cigarro nos bares e restaurantes de Sao Paulo. Papai acendeu o cigarro na area proibida, para indignacao do alemao que estava ao seu lado, ciente da norma que tinha acabado de entrar em vigor. "Mas e lei!", vociferava o alemao, enquanto papai tentava explicar que, no Brasil, tem lei que "pega" e tem lei que "nao pega", algo incompreensivel para a disciplinada mente oriunda do velho continente. O fato e que a lei nao pegou, os fumantes se divertiam enquanto soltavam a fumaca na cara da proibicao.

Na europa as leis funcionam porque o povo e disciplinado. Ou sera que o povo e disciplinado porque as leis funcionam? Me parece uma questao como a do ovo ou a galinha, o que veio primeiro?

Em tese e otimo viver num lugar onde as leis sao cumpridas, mas a obedienca cega as normas as vezes carece de bom senso. Uma nova medida internacional de seguranca proibe o embarque com liquidos acima de 100 ml, entao eu quase perdi minha solucao de lente de contato, e sorte minha que estava de oculos, nao poderia tirar a lente para dormir durante o voo de 8 horas durante a noite. Na cabeca deles eu posso ser um terrorista com material para fabricar uma bomba caseira.

Paranoia, eu digo, e eles respondem que paranoias como essa poderiam ter evitado a tragedia do 11 de Setembro. Entre evitar o desconforto de poucos e garantir a seguranca de muitos, as leis devem zelar pela segunda opcao, e se isso permite distorcoes, o mesmo acontece com as reivindicacoes do bom senso. A disciplina faz pelo coletivo o que o "jeitinho" faz pelo indivudual, e o coletivo deve vir em primeiro lugar, voce nao acha?

Tuesday, August 21, 2007

Potenciais Incertos

Uma pergunta que volta e meia me perturba: estou fazendo o meu melhor? Quando nao atingimos o resultado esperado, conforta pensar que teriamos conseguido caso tivessemos nos esforcado mais. Agrada mais ao ego ter um grande talento latente do que uma mediocridade plenamente desenvolvida. Sou capaz, so nao me esforco o suficiente. Ou nao me esforco o suficiente por medo de me descobrir incapaz?

Nao sabemos ate onde podemos chegar atraves do esforco porque nao sabemos o quanto podemos nos esforcar. Nada e tao bom que nao possa melhorar, nao ha uma linha de chegada para a distancia a percorrer, a nao ser o que acreditamos ser bom o bastante. E para diferenciar uma satisfacao merecida de uma acomodacao preguicosa e preciso ter uma ideia clara do que esta dentro e fora do nosso alcance.

O filme "Em busca da felicidade", com Will Smith, ilustra bem o ponto. Narra a transformacao de um vendedor fracassado em um bem sucedido executivo. Passa a ideia de que tudo e possivel, se voce da duro o suficiente. Para "chegar la", o cara mal dorme, nao tem um minuto de lazer, e come todas as refeicoes lendo o livro da empresa. Um esforco altamente irrealista, embora eu acredite que existam pessoas assim, o filme e baseado numa estoria real.

Ha quem diga que o quanto podemos nos esforcar e uma caracteristica geneticamente pre-determinada, o que pode ser tanto a gloria quanto o desespero dos que acreditam nao estar suando o suficiente. E a vaidade pode criar tanto a vontade quanto o medo de descobrir o quao melhor voce pode se tornar. Mas o pior de nao tentar nao e nao chegar la, e ter que conviver com as angustiantes duvidas do "e se?". Afinal, nada pior do que o ouro, prestes a ser alcancado, ser negado por que alem do arco iris nao se ousou.


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Thursday, August 16, 2007

Fotolog parte 2

Atendendo a pedidos, a fase fotolog segue firme e forte. Afinal de contas, palavras nao conseguem traduzir um tanto do que quero compartilhar com voces. Se as coisas seguirem nesse rumo, podem aguardar um post em miguxes num futuro proximo.


Essa e a placa que informa em quanto tempo os onibus vao chegar. Nao e fantastico?


Eis aqui a bela orla de Brighton. Descendo a rampa voce encontra varios bares e boates, ligeiramente mais sofisticados que os quiosques e barracas de Boa Viagem. Mas caldinho que e bom, eles nao tem! :D



No fundo o pier de Brithon, um dos pontos turisticos da cidade, onde ha bares, fliperamas e montanhas russas. O passaro devia ter ficado exatamente no centro, vou me esforcar mais da proxima vez.



Num pub perto do mar, com a espanholada toda. Tem gente demais para identificar todo mundo, o que e uma otima desculpa para meu esquecimento de alguns nomes. Mas posso identificar a cerveja na mesa, se nao me falha a memoria, era uma Stella Artois. Ou era uma Carlings? Agora nao estou 100% certo...

Saturday, August 11, 2007

Doses abatidas

O que se pode fazer com duas doses de tristeza?
Mistura-las com cerveja afogando as magoas com os amigos?
Impossivel no momento. Outra ideia para a batida?
Filtra-las com lembrancas muito menos abatidas?
Com musicas propicias para conversa introspectiva?
Parece bom, considerando a falta de opcoes,
lembrando o quanto ja preparei drinks semelhantes,
sabendo que a bebida desaparece no outro dia...
Afinal, sao so duas doses.

Wednesday, August 08, 2007

Fotologueando

Durante todo esse tempo eu resisti a tentacao de fotologuear meu blog, afastando com isso as visitas de pessoas que nao se sentem atraidas por quilos de textos sem imagens. Bem, chegou a hora de ceder, lembrando a definicao de "abstemio" de Ambrose Bierce: Uma pessoa fraca que cai na tentacao de negar a si propria um prazer. Seguem algumas fotos das minhas andancas aqui em Brighton.




Da esquerda para direita: Lidia, espanhola; Alex, espanhol; Johana, Romena mas vivendo na Espanha; Maria Rose, Espanhola; Eu, Brasileiro; Rossi, Espanhol. Uma otima tarde na praia, excluindo o fato do povo falar em espanhol muito rapido, me impedindo de entender as conversas boa parte do tempo.



No Babylon Lounge, boate a beira mar: Eu, Maria Rose, Alex, Gemma (espanhola tb), Lidia e Rossi. Ah, essa noite podia ter terminado diferente... :P

Tuesday, July 31, 2007

Curiosidades britanicas

O transito na Inglaterra parece ter sido criado para aumentar as chances de atropelamento de estrangeiros. Aqui os carros "sobem" pelo lado esquerdo e "descem" pelo lado direito. Nao foram poucas as vezes que vi incautos atravessarem a rua olhando para o lado errado, apenas para ouvir a buzina irritada do carro vindo no no sentido contrario. Ah, e aquela estoria de "colocou o pe na rua os carros param" e lenda, pelo menos aqui em Brighton: serve apenas para disparar as buzinas irritadas.

Mas o transito silencioso e verdade mesmo: os britanicos, ao contrario dos brasileiros, sao pouco propensos a praticar percussao nas buzinas de seus carros. Elas servem apenas para previnir acidentes com pedestres incautos ou motoristas barbeiros. O contagio percussivo dos engarrafamentos brasileiros inexiste por aqui, os ingleses esperam a fila andar em silencio.

Um outro detalhe que me impressionou e que quase todas as paradas de onibus tem uma placa eletronica informando em quanto tempo cada onibus vai chegar. Nada de esperar por seculos e comecar a se perguntar se todos os onibus da linha quebraram: aqui eles chegam rapido e te dizem em quantos minutos. Algumas vezes a placa erra, mas na maior parte das vezes ela acerta, o que ja e espantoso o bastante.

Eu sempre ouvi dizer que os britanicos sao um povo muito pragmatico. Um excelente exemplo disso sao os banheiros dos bares e boates: neles ha uma maquininha onde se compram camisinhas, viagras e remedios para ressaca e dor de cabeca. Voce coloca as moedinhas e garante a seguranca das suas colocacoes libidinosas. Faz muito sentido, afinal as chances de encontrar coleguinhas para brincar sao muito maiores nos bares e boates do que nas farmacias. Espertinhos, esses ingleses.

Tuesday, July 17, 2007

Celulares perdidos

Durante os preparativos para a viagem, resolvi nao ouvir o conselho do meu pai sobre comprar um despertador. Para que, se meu celular cumpre essa funcao? Embora ele nao funcione como um telefone por aqui, ainda assim e util como despertador, calculadora, agenda, minigame... Comprar um despertador e nao levar o celular simplesmente nao fazia sentido.

O que eu nao podia imaginar e que o meu celular e muito velho para a avancada tecnologia britanica. Fui em duas lojas, e eles disseram que eu nao encontraria baterias para ele, "because it's too old". Eu me senti o dono de um artefato pre-historico. Devido ao alto indice de roubo de celulares em Recife, eu fazia questao de ter o modelo mais barato, e tapava os ouvidos para o canto da sereia dos equipamentos mais modernos.

Como eu queria o celular essencialmente para funcionar como despertador, resolvi recusar a oferta de um modernoso por 30 libras, para comprar um modesto despertador de 3 libras. Antes da compra, no onibus voltando para casa, embaixo dos jornais jogados no banco, eis que encontro um celular perdido que, se nao era a ultima novidade no mercado, certamente era bem mais avancado que o meu.

Passeando com os botoes pela tela colorida, eu assistia o anjinho e o diabinho discutindo sobre o que fazer com o achado. Nao havia ninguem perto, nada que me impedisse de colocar o celular no bolso. Mas nao o fiz, o anjinho ganhou a briga logo no comeco, e eu nao sei explicar direito o porque. Pensei no dono feliz ao recuperar sua perda, senti que minha consciencia pesaria caso ficasse com o equipamento. Alem disso, eu tinha a certeza que ao entregar o celular para o motorista, eles dariam um jeito de entrega-lo ao dono. Nao sei se agiria da mesma forma caso estivesse no Brasil. Sei que boa parte dos meus amigos devem achar que fui otario, que deveria ter ficado com o eletronico. Essa e a opiniao do meu brother britanico. E voce, o que acha?

Saturday, July 14, 2007

Spray contra timidez

Cientistas inventaram um spray para combater a timidez. Ele imita um hormonio do bem estar (Oxytocin, em ingles) que dewixa as pessoas calmas. O hormonio e produzido naturalmente quando estamos apaixonados, a versao sintetica foi desenvolvida apos quase 10 anos de pesquisa na Universidade de Zurique. O invento foi testado em 70 pessoas. Elas deixaram de se sentir ansiosas e tiveram grande melhora no desempenho em dificeis situacoes sociais. O produto sera testado em escalas maiores, e se confirmado seu funcionamento, podera estar a venda nos proximos cinco anos.

Ou seja, em nao muito tempo, na hora de falar com aquela pessoa, algumas borrifadas no nariz vao eliminar o nervosismo que retira da boca as frases certeiras. Falar em publico deixara de ser um drama. Os bloqueios da timidez serao removidos pelo avanco da ciencia.

Suponhamos que o produto cumpra o que promete com perfeicao, sem nenhum efeito colateral. Um aumento na autoconfiana acessivel a qualquer hora. Frio na barriga? Spray na venta! Me vem logo na cabeca os versos de Raul Seixas: "E onde e que esta a vida? Onde esta a experiencia? Ja te entregam tudo pronto, sempre em nome da ciencia, sempre em troca da vivencia..."

Claro que o invento sera maravilhoso para os que sofrem de fobia social cronica, que ja tentaram e nao conseguiram superar suas limtacoes atraves do proprio esforco. Mas uma infinidade de gente vai deixar de tentar se superar, porque a superacao vira em spray. Pessoas que poderiam aprender a lidar e se livrar dos seus bloqueios, e ter com isso uma experiencia formidavel. Mas quem liga para experiencias? O que interessa sao resultados, embora o que torne a vida fantastica nao seja seu resultado (a morte), mas os caminhos que percorremos... Avancos como esse spray percorrem boa parte do caminho por nos.

Tuesday, July 10, 2007

O cara chamado O Rafa

O cara se foi. Rafael Virgínio Torres, mais conhecido como O Rafa, morreu nas vésperas da minha viagem à Inglaterra e do seu aniversário de 25 anos. Foi o segundo amigo muito próximo que desencarnou prematuramente. O primeiro, Felipe Braga, sofria de leucemia e sua saída deste mundo era anunciada pelo próprio, que tinha plena consciência disso. O Rafa também tinha uma doença rara. Mas ninguém imaginava que ela pudesse tirar sua vida tão cedo, o ataque cardíaco fulminante pegou todo mundo de surpresa.

Durante minha festa de despedida, ele sentiu dores e achou que era gastrite. Não era, era o coração mandando o alerta, e esse conhecimento tardio traz uma dor extra para os que estavam presentes, que poderiam tê-lo levado para o hospital a tempo se soubessem, e para os que saberiam o que fazer caso estivessem presentes, mas só tomaram conhecimento do caso quando o tempo dele já havia se esgotado.

Lembro-me do início do meu tempo compartilhado com ele, quando eu era um nerd iniciante querendo saber mais sobre RPG, e ele um nerd mais experiente na arte de viver aventuras em mundos imaginários. Ambos passamos pela libertação da nerdice atraves do rock e seu tão conhecido pacote. O Rafa já desenvolvia seu enorme talento musical em bandas folclóricas, como Trissomia e El Matador. Era o cara que ia para rodas de choro com a camisa do Ramones (na verdade, ele usava essa camisa para quase tudo que fazia). Até hoje sei tocar um trecho de Jacob do Bandolim que ele me ensinou, entre cigarros e pedestres da Av. Inácio Monteiro.

Com a Mombojó, O Rafa ficou famoso. Eu o chamava de cenoso, e morria de inveja do sucesso que ele fazia com as gatinhas culturais do Burburinho/Capitão Lima. Ele dizia que eu era uma promessa da cenosidade, e deveria voltar aos holofotes. Eu já não o via com tanta frequência, o tempo do cara estava tomado pelos seus diversos trabalhos musicais. Há tempos vinha tentando marcar uma sinuca com ele. Poderíamos ter jogado na minha despedida, mas não jogamos, acabou não acontecendo.

O que ainda aconteceria na vida do cara é uma enorme interrogação, que traz consigo um doloroso vazio. Mas a grandeza da interrogação é por conta da exclamação, muito maior, que foi sua vida, tocada com a sensibilidade de seu ouvido absoluto. O choro aqui foi grande, mas lá onde ele está, ao lado daqueles bambas todos, a melodia deve estar emocionando até o tempo que o levou.

Sunday, June 24, 2007

Presunçoso preguiçoso

Eu às vezes penso que quanto mais obras se conhece
Mais se chega à sensação de que tudo já foi feito
Às vezes desmentida por um criativo que esquece
De se amarrar por aquilo que já se transformou em êxito

Todos os destaques da área que apetece
Lançam sobre quem cria dois distintos efeitos
Vontade de se firmar ao lado do tal mestre
Ou desânimo de ver fora do alcance tal respeito

Por mais que um atleta se esforce
O ouro exige mais que dedicação
Muitos darão o melhor de si e não conseguirão

Por isso o presunçoso preguiçoso nem se move
"Para quê batalhar por uma inatingível posição?"
E deixa de saber onde o levaria a vocação.

Saturday, June 23, 2007

3 sons chapantes

Tem uma música do Black Alien que vem fazendo minha cabeça inúmeras vezes nos últimos dias. Chama-se “From Hell do Céu”. Ouça e repare na riqueza das rimas do cara, que já fisga a atenção nos primeiros versos: “Me parece agora que eles perderam o controle/Nessa corrida de ratos sei muito bem quem tá na pole/Se agride ou agrada/O seu lugar no gride de largada, não muda nada...”.

Do rap ao samba, do Rio à Bahia, outro som tem batido recordes de execução nos meus auto-falantes. “Oxossi”, de Roque Ferreira, me chapa não pela letra, cheia de referências ao candomblé que desconheço, mas pelo ritmo, pela reverência do cara ao cantar, como se comandasse um ritual religioso – acho que, na verdade, é isso que ele está fazendo mesmo. Catarse garantida.

Por último, uma música de Paulinho da Viola, gravada por Marisa Monte: “Para ver as meninas”. Uma amiga defende que Marisa Monte é irritante, por deixar as músicas todas perfeitinhas. Bom, nessa música a excelência técnica dela, junto à singeleza da letra, passam um feeling assombroso.

Sunday, June 17, 2007

Espinha Ereta

Nada como uma boa postura. “É tudo uma questão de manter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranqüilo”, diz o samba “Coração Tranqüilo”, do compositor Walter Franco. Ele está certíssimo. Uma coluna saudável responde mais pela felicidade do que qualquer bem de consumo ou estado alterado de consciência. Pergunte a quem sofre de dor nas costas.

Quando pequeno, minha mãe sempre alertava: “Bernardo, olha a postura!”. Ela sabia do que estava falando. Descuidou da coluna ao longo da vida, e hoje sofre as dolorosas conseqüências. Eu, que sempre tive um “Do Contra” abobalhado dentro de mim, não dava bola e continuava envergado. E hoje, aos 22, já sofro um pouco pelo hábito nocivo.

Boa postura devia ser ensinada nas escolas. Passamos boa parte do tempo sentados vendo aulas, e uma coluna ereta exige atenção e disciplina, porque a tendência é deixar a gravidade agir e os ombros caírem, plantando a semente do sofrimento futuro. Não adianta só estimular os esportes, se boa parte do tempo será gasto sentado, diante do caderno ou da mesa de trabalho.

Todos os lugares em que as pessoas passam muito tempo sentadas deveriam ter uma faixa com a letra de “Coração Tranqüilo” escrita em letras garrafais, com “espinha ereta” em negrito. E todos os pais deveriam alertar seus filhos feito minha mãe, cabendo aos rebentos não serem trouxas como eu e seguirem o conselho.

Monday, June 11, 2007

Orgasmos Intelectuais

Venho observando que as artes não têm mexido muito comigo ultimamente. Artes visuais nunca me despertaram grandes coisas. Mas a música e a literatura, que já me provocaram aquelas viagens em que você sente o seu mundo interno se expandindo e transbordando de uma espécie de êxtase, bem definido por um antigo professor como "orgasmo intelectual", mesmo elas não têm me trazido sensações incomuns. Me pergunto se houve queda na qualidade das obras que aprecio, e vejo que, na verdade, é minha sensibilidade perdendo seu poder de encantamento.

Não sei explicar. Talvez uma defesa contra fortes sentimentos negativos tenha prejudicado a percepção dos positivos. Afinal, o canal é o mesmo: se há uma barragem para conter as águas sujas, vai bloquear as águas limpas que também passam por ali.

Sei que a atual falta de encantamento gera uma nostalgia que já está ultrapassando os limites do tolerável. O retrovisor dourado, que deixa o atual percurso sem graça. Ou a não-graça do percurso que me faz dourar o retrovisor. De todo modo, é preciso diminuir o peso das memórias. Senão fica difícil alcançar os orgasmos intelectuais.

Friday, June 01, 2007

Dentro da Bolha

A gente vai vivendo dentro da bolha, e quando se dá conta, já deixou de percebê-la... Fazendo os mesmos trajetos, porque a violência não recomenda certos caminhos, a violência é parceira da bolha, elas dividem os lucros no fim do mês. E esse mundo, vasto mundo, vai se tornando pequeno, como aquelas paredes dos desenhos animados, que vão diminuindo o espaço até que o herói escape por uma passagem secreta, evitando por segundos o esmagamento.

A bolha, o mundo pequeno... Neste momento, 22h46min, eu gostaria de caminhar pelas proximidades da minha casa, prestando atenção nos caminhos, em busca da passagem secreta. Mas em qualquer esquina pode haver uma armadilha mortal, ou pelo menos essa é a idéia corrente, e o medo, principal componente da bolha, me leva a não conferir o risco.

Falando assim, pareço um pirralho de condomínio rico, desconhecedor do mundo fora das cercas eletrificadas. Nada, eu já fui maloqueiro, andava pelas madrugadas de ônibus, e nem faz tanto tempo assim. A violência aumentou um bocado de lá pra cá, eu mudei de bairro, a bolha cresceu, ou melhor, a bolha diminuiu o meu mundo.

Tem hora que dá uma vontade danada de dizer: “que nada! Dane-se a violência, aqui quem comanda é a gente!”, como na época em que eu andava pelas madrugadas de ônibus, protegido pela inocência de me achar maloqueiro, ou pela violência ainda não tão grande. Era uma proteção bem melhor que a da bolha.

O que se pode fazer para sair da bolha? Correr risco ao andar pelas madrugadas de um bairro violento da capital mais violenta do Brasil? Só se for de carro, que meu escudo-de-inocência-maloqueira já se quebrou. Fazer trabalho social nas comunidades próximas à minha casa, ganhando o respeito da bandidagem e passe-livre pelas redondezas, além de contribuir um pouquinho para minimizar a violência? É uma boa opção, embora o tal respeito possa não passar de viagem minha. Mas a bolha, além de reduzir o mundo, e talvez exatamente por isso, também deixa apático. Descontente com a situação, mas sem energia para combatê-la. Até porque meus atos quase nada mudariam, e a estória de fazer a minha parte, embora bonita, é insuficiente para me tirar da inércia.

“Então morra na bolha, preguiçoso maldito!” – é o que escuto, de longe, do jovem inconformado que ainda não teve seu idealismo destroçado pelo mundo. Não faz tanto tempo que sua voz era próxima, quase saindo da minha própria boca, quando andava de ônibus pelas madrugadas da cidade. Pena que foi ficando distante, não por coincidência, à medida que fui me deixando aprisionar pela parceira da violência, com quem divide os lucros no fim do mês.

Wednesday, May 23, 2007

Idéias Próprias

Lembro-me de uma versão para videogame do desenho Beavis and Butthead. Quando você ficava muito tempo sem movimentar o personagem, surgia um balão de pensamentos, daqueles de histórias em quadrinhos, completamente vazio. Uma imagem perfeita para “não ter nada na cabeça”. A principal maneira de evitar esse vazio mental, todos nós sabemos, é através de boas leituras.

Mas não é bem assim. De acordo com o professor Rubem Alves, na sua coluna na Folha de São Paulo, o excesso de leitura pode fazer com que a pessoa deixe de pensar por si própria. Ele conta o caso de quando selecionava candidatos a doutorado, e teve a idéia de fazer uma única pergunta a todos eles: “Fale-nos sobre aquilo que você gostaria de falar”. Os candidatos entraram em pânico, não sabiam o que responder. Uma mulher chegou a citar várias partes de um livro da bibliografia obrigatória, achando que a pergunta era uma brincadeira.

A idéia é que, ao ler, estamos acompanhando o pensamento de outros. Se passamos a maior parte do tempo lendo, a menor parte do nosso tempo é dedicada a nossos próprios pensamentos. A conseqüência é que nossa mente fica habituada a papaguear pensamentos alheios, enquanto nossas idéias próprias são pouco produzidas, tendendo a desaparecer.

Uma questão interessante é: até onde nossas idéias são de fato “nossas”? Mesmo aquelas a que chegamos não por leituras, mas pelos “próprios méritos”. Existe o provérbio que afirma: “Do nada, nada sai”. Se tivéssemos acesso ao processo mental que levou àquela idéia original, veríamos que ela caiu do céu como um raio de inspiração, ou que foi fruto do trabalho mental, que lida com elementos preexistentes, saberes anteriormente adquiridos de algum modo, seja leitura, experiência, filmes, discos, conversas...? Ou será que ela irrompe desse subterrâneo a que não temos acesso direto, que é o nosso inconsciente?

Sobre a questão da originalidade, vale a pena conferir a tira do Arnaldo Branco.

Friday, May 04, 2007

Escrevendo o trivial

A preguiça já foi elogiada, agora bateu o cansaço de não fazer nada. Somado ao longo tempo desse blog cultivando teias de aranha. Já tem alguns dias que eu digo pra mim mesmo que preciso escrever algo. Mas sempre esbarro no “o quê?”, e rendo-me à frustração do bloqueio criativo.

É aquela velha lei do menor esforço, que limita minhas ações àquilo que penso fazer bem e com pouco trabalho, ou melhor, sem grandes obstáculos no caminho. Escrever apenas quando surge alguma fagulha de inspiração, falar somente quando tem algo de interessante para dizer. E os momentos pedindo qualquer texto, não importa se desinteressante, irrelevante, lugar-comum ou repetição. Tem horas que qualquer coisa é melhor que coisa alguma.

Quando se quer ser brilhante o tempo todo, são grandes as chances de se tornar um tolo. Eu tenho o hábito de tentar prever o resultado de tudo que faço, mania adquirida pelo gosto por xadrez e Sherlock Holmes. Só que ações criativas são imprevisíveis, ou melhor, tentar calculá-las é uma boa maneira de estragá-las, já que nelas a intuição é bem mais importante que o cálculo, e um processo anula o outro.

Um conselho a todos que só falam quando lhe ocorrem grandes sacadas: falem merda, daquelas bem idiotas, que lhe renderiam um babau na quinta série. Livre-se da obrigação de ser “cabeça”. É um fardo que não vale a pena carregar: você se diverte menos, acaba se levando muito a sério, torna-se uma pessoa pesada, e isso não o torna mais inteligente.

O mesmo vale pra quem escreve, principalmente quando a criatividade está bloqueada por pretensões cabeçudas. Permita-se escrever algo trivial. É melhor do que ficar sem escrever, esperando por inspirações incertas.

Tuesday, April 17, 2007

A graça do The Playboys

O show do The Playboys, na última noite do 15º Abril pro Rock, foi o destaque negativo das bandas pernambucanas no festival. Essa é a opinião do jornalista Renato L, impressa na contracapa do Viver, caderno cultural do Diário de Pernambuco. “A banda precisa tornar corrosivo seu humor “colegial”, quase inofensivo, para não passar outros 10 anos longe do Abril”, afirmou o parceiro de Chico Science e Fred 04 na elaboração do manifesto “Caranguejo com Cérebro”, marco inicial do movimento Manguebeat.

A versão musical do manifesto é a faixa “Monólogo ao Pé do Ouvido”, que abre o primeiro disco de Chico Science e Nação Zumbi, Da Lama ao Caos. O The Playboys fez uma paródia curiosa dessa música, ironizando as imitações do mangueboy que tomaram conta da cena pernambucana, após a morte dele. É difícil encontrar humor mais corrosivo. Infelizmente, no show do Abril, essa letra foi mudada, perdendo um bocado de sua acidez. Em vez de desacatar alguns mangues, especificamente, tiraram onda com os indies, genericamente.

O humor “colegial” da banda fez rir a maior parte da platéia. As letras debochadas, com os personagens típicos da cena local, são o ponto forte das estrelas do movimento do “alto dos apartamentos de Boa Viagem”, como costumavam anunciar nos shows da época em que Devotos e o Alto José do Pinho eram destaque.

Eu achei estranho a banda ser criticada justamente naquilo que tem de melhor: o humor. Na cobertura do festival feita pelo Recife Rock, a avaliação do show é oposta a de Renato L. Talvez isso se explique porque os responsáveis pelo site são mais jovens que o jornalista do Diário, riem com mais facilidade das brincadeiras de adolescência. Ou talvez Renato L não ache graça numa banda fazendo piada de algo que ele ajudou a formar. Considerando que Roger, que também é um jovem de outrora, assistiu ao show soltando várias risadas, tendo a acreditar na segunda opção.

Saturday, April 14, 2007

Futebol no Abril pro Rock

Abril pro Rock de 2007, 15ª edição. A Nação Zumbi estava no meio de seu compacto show de abertura para os Mutantes. De repente, Lúcio Maia tira da sua guitarra o hino do Santa Cruz, time que caiu para a série B ano passado, fez um péssimo campeonato pernambucano, mas conseguiu a proeza de acabar com a invencibilidade do Sport no último jogo, ou, como preferem os mais diretos, tirou o cabaço do leão.

A maior parte da platéia levantou a mão numa dedada, em resposta ao hino da cobrinha. O Sport tem a maior torcida do estado, e os rubro-negros, embora bicampeões pernambucanos, ainda estavam sentindo o veneno da cobra tricolor, espalhado nas provocações das torcidas rivais.

Lúcio Maia não se intimidou e tocou o hino novamente, afirmando que "torcedor bom é aquele que torce quando o time tá perdendo". Frase bonita, mas que ficou com cara de média para os desgostosos da platéia, pois é difícil imaginar o hino sendo tocado se o Santa tivesse perdido o último jogo.

O show continuou, os dedos baixaram, e eu achei o incidente divertidíssimo. Mas houve quem tivesse a noite estragada pela gréia musical. Sérgio Bernardo, estudante de jornalismo de credibilidade inquestionável, me contou de um cara ao seu lado que ficou transtornado com as notas da dança da cobrinha. "Eu paguei, po! Não tinha que ouvir isso, fuleiragem da porra!", gritava o rubro-negro emputecido, que minutos antes estava cantando feliz as músicas da banda.

Rivalidade no futebol é um lance muito curioso. Para mim, que sou indiferente à questão, é difícil entender como o desempenho de seu time, ou as provocações adversárias, podem causar terremotos tão fortes no humor das pessoas. Ao mesmo tempo, acho arretadas as gréias esportivas, as provocações bem humoradas, e os entusiasmos de torcedor. Próxima semana devo ir a um estádio, lugar onde nem lembro quando entrei pela última vez. Quero ver se sinto a energia que faz tanta gente vibrar, torcendo para que não seja preciso deixar de curtir um belo show por conta disso.

Wednesday, March 28, 2007

Medo do Futuro

É duro reconhecer a mediocridade
Formando-se na preguiça do teu gênio
Que evita o esforço na atividade
Adiando-o até o último momento

É duro ver cair a confiança
Numa mente, outrora vigorosa,
Hoje, como ex-atleta que descansa
Afundado na poltrona prazerosa

É duro perceber-se tão contente
Com os pífios resultados do versejo
Quando basta ler alguns mais competentes
Para ver que não há motivos pra festejo

É duro procurar na poesia
preencher a lacuna do labor
Tentar compensar com fantasias
O mal que a moleza lhe deixou

É duro discernir o que é preciso
Para livrar-me da própria corrente
Que me prende a caminhos antigos
E amarra o que viria pela frente.

Saturday, March 24, 2007

Clara Nunes, a maior cantora do Brasil


Do Contra é um dos personagens mais divertidos de Maurício de Souza. Tem muita graça em querer ser sempre diferente. É comum ser do contra na adolescência, antes de amadurecer e perder a graça. Mas alguns seguem cultivando esse prazer infantil, fazendo objeções pelo prazer de ver as pessoas lidando com elas.

Uma unanimidade inteligente é que Elis Regina é a maior cantora do Brasil. Afinação, interpretação, feeling e técnica olímpicos, qualidade do repertório, são muitas as razões do consenso.

Eu discordo. Não da qualidade de Elis, mas dela sozinha no topo. Tem uma mineira chamada Clara Nunes, que não perde um centímetro para a divindade gaúcha nos critérios acima citados, com a vantagem decisiva de que seu timbre e seu repertório soam melhor aos ouvidos deste que vos escreve.

Para os que desconhecem a maior cantora do Brasil, seguem algumas preciosidades selecionadas por mim, na convicção de que algumas discordâncias não têm preço.

Preciosidades Selecionadas

Thursday, March 15, 2007

Tempo e cigarros

Astolfo e Olarico caminhavam sem destino. Era um bom programa de fim de tarde; bairro tranquilo, poucos carros, alguma brisa. Astolfo parara de fumar há alguns meses; Olarico continuava sem perder a oportunidade de soltar fumaça com gracinhas.

- Desde que tu parou de fumar que tás assim, nessa apatia de anta paralítica.

- Claro, lascar meu organismo pra nada me dava uma energia indescritível.

Olarico tragou forte, e fez aquela cara de sabedor dos grandes segredos, que todo fumante faz:

- Essa é a questão, você não tava nem aí se dentinho ia amarelar, ou se pulmão ia ficar pretinho, nem pensava no câncer ou no efisema. Você era um fumante despreocupado e divertido, agora é um ex-fumante preocupado e apático. Que progresso, heim?

Era por coisas como essa que Astolfo tinha grande consideração por Olarico, o rei dos contrapontos divertidos.

- Minha apatia não tem nada a ver com cigarro, meu caro. Tem a ver com onde estou, e onde deveria estar, e não saber onde quero estar.

Olarico deu outra profunda tragada, prenúncio de outra "grande verdade", mas calou-se. No fundo se sentia como o amigo, embora não curtisse muito conversar sobre isso. Preferia pensar a respeito sozinho, com tragadas profundas, mas sem grandes verdades.

Astolfo continuou: - Sabe quando você olha para quem você era há oito anos, e sente vontade de voltar a ser aquele cara? Isso é normal acontecer - quando se tem cinquenta, pensando nos vinte e poucos.

- Eu diria que há oito anos você não tava nem aí se era normal ou não. Aliás, a maior parte das pessoas diria que não.

- É, eu sei, mas não é esse o ponto. O lance é o entusiasmo, a paixão pela vida, que era imensa há oito anos, e hoje mal levanta uma caneta. Não deveria ser assim. Era para eu estar no auge agora, nos meus vinte e poucos.

- Talvez você tenha vivido seus vinte e poucos há oito anos, e agora se encontre em plena crise da meia idade.

- E o que me aguarda depois disso?

Olarico acendeu outro cigarro: - Sei lá. A cova?

- Pra essa você vai na frente, com sua chaminé.

- É melhor queimar do que apagar aos poucos.

- Última frase do bilhete suicida de Kurt Cobain.

Olarico deu outra tragada forte: - É, mas a frase é de uma música de Neil Young, que continua vivo e cantante.

- Eu sei disso... Há oito anos que eu sei disso.

- E há oito anos que eu peguei seu Nevermind emprestado, sem sua permissão, e nunca devolvi.

- Disso eu não sabia.

- Pois é. Tem coisas que é melhor não saber.

Sunday, March 04, 2007

Sem tomar Aspirina

Conforta imaginar um si mesmo aperfeiçoado, calejado dos erros cometidos, acostumado com dificuldades já experimentadas. Conforta imaginar um know-how crescente, uma experiência acumulada que não só melhora suas ações, como também protege do sofrimento gerado pelo si mesmo. Conforta viver sob as leis da evolução, tornando-se uma criatura mais apta a sobreviver, com a passagem do tempo.

O que desconforta é saber que o carro do aprimoramento não anda em linha reta rumo ao topo. Saber que às vezes ele desce a estrada, em vez de subir. Saber que noutras, simplesmente enguiça, o tempo indo e o carro ficando. Mecânicos são chamados, empurrões tentam, mas o carro não dá partida, definindo um período do qual a lembrança é uma única paisagem congelada.

Lembranças que ajudam o carro a retomar o movimento. Lembranças que fazem com que seja gasto mais tempo com o retrovisor do que com a estrada à frente. Lembranças que gostaríamos de perder, ou de jogar para o futuro. Lembranças freio-de-mão, lembranças quinta marcha.

Após umas cervejas, quase no fim da tarde, contemplando o mar, me invadiu uma plenitude, como se toda a trajetória, com suas subidas, descidas e paradas, fizesse algum sentido. Poucas horas depois, em plena dor de cabeça, a conclusão que eu chegava é que não fazia sentido algum. Meio sentido, resolvi escrever esse texto. E então a dor de cabeça passou.

Sunday, February 25, 2007

Elogio da Preguiça

Para quê preencher a folha em branco
Se há tanto canto para ouvir?
Para quê forçar a busca de palavras
Se não há uma meta certa a atingir?

Não há caos para organizar
Recalques para extravasar
Castelos para se demolir

Tudo ordem, tudo em paz
Ilusão breve que satisfaz
Quem não gosta de se iludir?

Quando deito na minha rede
Nenhuma fome, nenhuma sede
Um sorriso... o paraíso é aqui

Deixo a mente passear
Vários fatos contemplar
Nada que me abale em si

Essa vida proibida
Que o sustento inviabiliza
Se tu não é o Dorival Caymmi

Traz um bem estar danado
Leva aos noventa em bom estado
Talvez cem se resistir

Se o planeta está morrendo
Quem só dorme o polui bem menos
Deveria ser pago pra dormir

O trabalho é inimigo da natureza
Disso o índio já tinha certeza
Não é sábio quem divergir

Pelo seu bem e bem do mundo
Faça um avanço profundo
Deixe a preguiça lhe invadir!

Wednesday, February 21, 2007

Sidney Miller

Seu nome é Sidney Miller. Segundo a Wikipédia, madrinha de preguiçosos em geral, o compositor estreante na década de 60 era comparado com um tal de Chico Buarque, também estreante, pela timidez e pelo cuidado na construção das letras. A primeira música que ouvi dele foi “A Estrada e o Violeiro” (Ouça), que é arrepiante de tão linda, dueto do cara com Nara Leão. Depois de meu pai elogiar entusiasmado, resolvi ir atrás de mais coisas dele. Aí a internet, grande mãe dos curiosos, infinito baú de tesouros esquecidos, me trouxe diversas músicas do rapaz, que não teve tempo de atingir o status de seu companheiro de timidez: morreu aos 35 anos.

Seguem mais duas músicas do gênio: “Pois é, Pra que” (Ouça) e “Nós os Foliões”, (Ouça) essa com um trechinho em fita cantado pelo próprio, depois com o timbre pacificador de Paulinho da Viola. Ouçam, e me agradeçam depois.

Wednesday, February 07, 2007

Carnaval fora de órbita

A pancadaria na orla de Boa Viagem, no show de Ivete Sangalo, teve divulgação nacional. Após 3 anos sem trio elétrico na praia mais famosa de Recife, o tumulto deu fortes razões para as prévias carnavalescas continuarem longe do mar preferido dos tubarões. O saldo foi de 150 ocorrências policiais na delegacia de Boa Viagem (o triplo do normal), um homem baleado e cerca de 20 feridos, além da depredação de bancos e banheiros públicos.

Tão ferida quanto os 20 ficou a imagem de Recife – a barbárie de Boa Viagem alertando sobre o que pode acontecer no carnaval da cidade. A prefeitura deve estar se lamentando por não ter deslocado mais policiais para cobrir o evento, de modo a evitar o filme queimado que pode afastar turistas.

Tanto os organizadores do bloco Balança Rolha, responsável pela vinda de Ivete, quanto a Secretaria de Defesa Social admitiram que subestimaram o público da festa – eram esperadas 200.000 pessoas, apareceram cerca de 500.000. Realmente, era difícil prever que uma artista obscura como Ivete Sangalo iria atrair tanta gente. Mas o organizador do bloco, o deputado André Campos, disse que mesmo que o público fosse metade do esperado, ainda assim o policiamento seria insuficiente.

A violência em Recife chegou a um ponto em que qualquer multidão desperta receios. Há quem responsabilize a ausência/ineficiência da polícia como a grande culpada. A impunidade para os criminosos faz com que o cidadão comum veja os direitos humanos com ironia – o criminoso desrespeita os direitos humanos e é protegido por eles. A impunidade joga álcool na fogueira da vingança, alimentando o discurso de que “bandido bom é bandido morto”.

Não é preciso muito esforço para ver a importância que a (falta de) educação tem nesse quadro. E essa lacuna é observada mesmo entre os que freqüentaram os melhores colégios, as melhores universidades. As pessoas estão cada vez mais míopes para as necessidades do outro – normas básicas de convivência deixaram de ser praticadas. E não há indício de melhoria geral, não enquanto vigorar o “consiga o que queres a qualquer preço, passando por cima de quem estiver no caminho”. Não enquanto a Ética continuar sendo um conjunto de princípios bonitos que não se aplicam à realidade.

Enquanto isso, brinquemos o carnaval – torcendo para que não chovam garrafas.

Tuesday, January 30, 2007

"Morte do Pai"

Diante do Pai, somos todos meninos
Ansiosos em mostrar o quanto somos bons.
Mas nossos melhores momentos são longe de sua presença
Da paralisia da expectativa, suposta ou real
Que negamos para poder andar, mesmo em círculos, mesmo a lugar algum
Que seguimos para nos ajustar, o trilho existe antes de nós
Que encaramos quando fortes o suficiente
para a psicológica “Morte do Pai”.

Sunday, January 07, 2007

Juízos Musicais

Todo mundo conhece Radiohead. Bem, pelo menos todo mundo interessante. Eita, lá vou eu denovo fazer juízos de valor das pessoas a partir de seus gostos musicais. Bobagem minha, claro. Nada impede as pessoas de gosto musical medíocre de não fazer jus às suas preferências. "Diga-me o que ouves e eu direi o que és" é tolice de quem superestima o papel da música na vida das pessoas. Besteira de pessoas cujas identidades as músicas ajudaram/ajudam a construir. Muitas pessoas tem muito mais o que fazer do que ouvir música, usando-a apenas para fins recreativos, e isso não as diminui em nada, a não ser para os bobalhões que acham a música o caminho para Iluminação, a verdade das criancinhas, o encontro com o self submerso no inconsciente.

Mas eu falava do Radiohead. Eu nunca gostei do Kid A, o sucessor do OK Computer. Ouvi pela primeira vez procurando por guitarras, e a ausência delas me frustrou a ponto de não querer ouvir denovo. Passei a meter o pau no disco sempre que tinha oportunidade, chamava-o de remédio contra insônia, e por aí vai. Mas ouvia muita gente com gosto musical interessante falar bem do disco. Resolvi ouvi-lo denovo. e descobri uma música que é o caminho para iluminação, a verdade das criancinhas, o encontro com o self submerso no inconsciente. É a faixa 4: How to Disappear Completely.

Como bem observou Doutor Domingos, a letra é bem budista, mas naquele clima de angústia radioheadiano. É uma tristeza que vai tão fundo que torna a música mortalmente perigosa para quem pensa em suicídio. Ao mesmo tempo, a letra conforta, com bons motivos para não puxar o gatilho. Quando a descobri, achei que teria que engolir tudo que falei do Kid A, mas Doutor Domingos me informou que ela é "a menos Kid A do disco", informação que foi recebida com especial alegria por alguém que adora música e odeia dar o braço a torcer.

ps: Não consegui uplodear a música, pra deixar o link pra vcs. O que uso tem limite de 10mb para upload, a música tem 10.3 mb, infelizmente.

Wednesday, January 03, 2007

Poesia tem que ser escrita à mão

Teclados são para redações
Prosas onde as palavras jorram
Exigindo correções
Poesia tem que ser escrita à mão.

O deslizar da caneta sobre a folha
Desenha a imagem poética na mente
Teclando você deleta essa escolha
Sua tela interna esvazia a cada enter

Não estou certo se termina diferente
Já que sinapses podem terminar
Antes da mão começar a se mover

Talvez dê no mesmo lugar
Mas à mão é pela beira-mar
E à tecla é por lugar de se esconder.

Monday, January 01, 2007

Paixão pela Vida

Em alguns, a paixão pela vida
É forte e desinibida
Desfile ciente do brilho.

Noutros, frágil como o barro
Modelado por desalegrias
Vagar em passo tímido.

A vida entre os extremos varia
Provando que a identidade
É uma constante mutação.

Mas a mudança é necessidade
Igual ao caleidoscópio que gira
Repetindo o mesmo padrão.