Wednesday, December 29, 2004

Tsunamis, Profecias, Acaso e Morte

Ondas de 10 metros arrastando o que estava no caminho. 24 mil mortos, número que deve aumentar. Doenças como a malária estão previstas para as áreas afetadas. Turistas em desespero tentam voltar para casa. Os países que não foram atingidos preocupam-se com a possibilidade.
Este início de século foi marcado por tragédias, mas a natureza ainda não tinha se revoltado com tamanha magnitude. Sinal do apocalipse próximo ? É o que profecias indicam. Paralelos às previsões fatalistas, estão o choro do garotinho cujos pais não se sabe se sobreviveram, a rede de esgotos destruida que testará os sobreviventes com doenças, a mobilização de organizações internacionais para conter as desgraças e reconstruir o que a fúria da água tocou.
A tragédia natural se junta às variadas tragédias provocadas pelo homem para compor um quadro assustador. Será que valerá a pena, para a minha geração, ter filhos ? Colocar uma vida num mundo onde se morre sem culpa, sem velhice, sem motivo ? Talvez isso sempre tenha ocorrido, de diferentes formas, ao longo da História: Fogueira da Inquisição, espada de mercenário, dentes de feras selvagens. Talvez o que assuste é perceber o quanto é frágil a segurança proporcionada pelo progresso da civilização. O quanto o acaso é responsável por nossas vidas e mortes.
Para mal ou bem, o acaso é uma manifestação daquilo que está além de nós, que muitos chamam de Deus. Não compreendemos de que maneira ele atua, que padrões segue, se é que segue algum padrão. Ficamos chocados com suas fatalidades porque todo o nosso esforço por segurança é inútil diante dele. Ninguém previu as Tsunamis, não foi possível. Será possível algum dia ? Talvez algum profeta saiba responder.

Sunday, December 05, 2004

Diversão

Domingão, me recuperando da farra dos dias anteriores, fui ao shopping recife com Paulo Mineirinho. Já virou hábito. Pelo menos uma vez por semana vou ao shopping com ele, fora as vezes que vou sozinho, ou com o pessoal do cursinho. Boa parte dos meus amigos fala: "pô, Bernardo, shopping é um saco..." Será ?
O que eu faço no shopping pode ser resumido em três itens: Tomar café de graça na sodiler, ler um pouco dos livros, olhar as mulheres. A companhia de Paulo é especialmente boa para este último, pois exercitamos a cretinagem criativa tecendo comentários sobre os monumentos ambulantes. Não vou entrar em detalhes em respeito à discrição do elemento mineiro. Posso dizer que é sempre divertido... e gratuito.
Atualmente existem muitas opções de diversão, várias tecnologias sendo desenvolvidas com este objetivo. No entanto, estes atalhos para a diversão muitas vezes não levam à ela. Quando levam não satisfazem, induzem a várias repetições da "atividade divertida"... até o ponto em que se enjoa dela. Então surge uma nova "atividade divertida" mais sofisticada... e o ciclo se repete.
O resultado é que somos cada vez mais exigentes com a diversão. Ficar conversando bobagens com um amigo num local agradável não é divertido, não quando se pode ir pro barzinho da moda, mandar torpedos pras gatinhas com o celular recém lançado. Será que a gurizada ainda joga pião, bolinha de gude, esconde-esconde, polícia e ladrão... ou será que pra eles toda a diversão se resume ao Playstation 2 e seus milhares de jogos ?
Quem não me conhece pode achar que sou um senhor ranzinza, com saudades da infância nos anos 50. Não, eu tenho apenas 20 anos. Não tenho aversão às novas tecnologias, eu as uso bastante. O problema é limitar-se à elas na busca por diversão. Porque será difícil não cair no comprar-usar-enjoar-comprar o novo. Elas são feitas pra isso. Quando demoram a enjoar, são lançadas novas versões, melhoradas, para que o ciclo continue. E a diversão gerada por este ciclo não satisfaz. Se o fizesse, o próprio ciclo morreria.
É bom lembrar que a melhor amiga da diversão é a imaginação. É ela que faz com que a criança pobre passe horas se divertindo com seu carrinho de madeira sem desejar outra coisa, pelo menos até os apelos do consumo a atingirem. É ela que faz com que uma ida ao shopping seja tão divertida, mesmo sem estar com um real no bolso.

Tuesday, November 30, 2004

Nadando

Há um certo prazer em não revelar o meu interior
Trancando dentro de mim minha suposta sabedoria
E esse deleite se espalha e se edifica em bases líquidas
Já que a própria sensação é fluídica
E flui com intensidade, sem ser compartilhada

Raramente a represa se abre
Já que a água, ao sair, muitas vezes volta suja
Mas será que já não estava impura quando contida ?
Maculada pela vaidade que tento não revelar ?

Seja como for, já me afoguei nesse mar
E suas cores caleidoscópicas anularam o meu fazer
Governado pela apatia, tive que fazer o caminho inverso
Tingindo tudo de preto e branco, para voltar a funcionar

Mas as cores me chamam, seduzindo-me quando tento evitar
E talvez agora eu possa mergulhar sem estilhaçar minha objetividade
Coisas que antes desprezava vêm a tona para me integrar
Seja com o mundo, seja comigo mesmo

Monday, November 29, 2004


Raul, em sua época de jejuns... Posted by Hello

Wednesday, November 24, 2004

O guia espiritual Raul Seixas

Ouvi Raul pela primeira vez muito novo, por volta dos 9 anos. Meu pai me chamou pra ouvir "Al Capone", no seu apartamento em São Paulo. De volta a Recife, o marido da minha prima me deu uma fita cassete de Raul. Decorei as músicas rapidinho, e como vivia a canta-las, minha madrinha me deu o "Raul Seixas: Uma antologia". Todas as letras, além do resumo da vida e um bocado de luz sobre as várias faces do baiano. Foi meu livro de cabeceira por um tempo.
Costumo dizer que uma das minhas grandes frustrações é saber que nunca irei a um show de Raul. Pagaria caro para vê-lo, mesmo que completamente embriagado, errando todas as letras. E eu não sou o único. Raul continua importante, seja para os que o viram no auge, seja para os que nem eram nascidos quando ele morreu. Uma das razões disso é sua "Metamorfose Ambulante". Tem Raul para românticos, realistas, místicos, rebeldes... Para quem só quer ouvir humor inteligente numa letra fácil ou para quem passa horas descobrindo diversas significações em suas letras.
É, Raul faz pensar. Talvez essa seja a principal razão de sua magia resistir ao tempo. Não é tanto a identificação ou a concordância com as letras, como ocorre com Legião Urbana e Los Hermanos. É o refletir sobre o que ele diz, interpretando da tua maneira, buscando a tua verdade. E Raul sabia como poucos vestir idéias com roupas diferentes. Uma mensagem anarquista numa música infantil exibida na Globo, uma música sobre Deus (ou melhor, Krishna) que muitos pensam ser sobre amor...
"Não sou cantor nem compositor, uso a música para dizer o que penso". Segundo Sylvio Passos e Toninho Buda, autores do livro que citei, a verdadeira vocação de Raul era ser escritor. Pois eu acho que a grande vocação de Raul era ser guia espiritual. Pode parecer estranho falar isso de alguém que morreu prematuramente devido ao abuso de álcool. Mas eu encontrei e encontro não apenas conforto, mas Luz e Caminhos na obra de Raul. "Tente Outra Vez" e "Planos de Papel" me ajudaram muito mais do que análises e livros de auto-ajuda. Por isso eu digo que sua vocação não foi frustrada. Pelo menos não pra mim.

Monday, November 15, 2004

Planta rara

Na estrada, cabelo ao vento, pedindo carona
Trazendo aos mais velhos lembranças de um tempo de sonhos
Na bolsa alguns motivos para gastar dinheiro com suborno
Que a ajudam a percorrer grandes distâncias, mesmo parada

Também carrega uma barraca para duas pessoas
Prefere acampar na praia, mas sempre viaja pro interior
Seus olhos claros combinam com a roupa que combina com a paisagem
Deixando os homens loucos para combinar algo com ela

Ciente do seu encanto, não se deixa envaidecer
E sua amistosa simplicidade a deixa ainda mais irresistível
No violão toca suas músicas preferidas
E mesmo as mulheres que a invejam adoram ouvi-la cantar

Mesmo conseguindo o que deseja facilmente
Pois ao seu canto de Ossanha nem Vinícius resistiria
Ela permanece loucamente sóbria, não desejando além da conta
Continua na sua busca, que não entende, mas sente

Adubando a vida de todos que encontra no seu caminho
Ela é planta rara, das que o sol tem especial carinho ao iluminar
Atualmente está contente por ter recuperado a liberdade
Perdida por um descuido, ao gastar a grana que precisaria para subornar

Wednesday, November 10, 2004

Arco-íris da solidão

É laranja e não ofusca
É azul e não fascina
É verde e não enaltece
É cinza e não deprime
É vermelho e não agita
É branco e não acalma
É amarelo e não anima
É marrom e não sustenta
Mas é negro e draga tudo
Reinando no arco-íris da solidão.

Monday, November 08, 2004

Incensos, modas e o que realmente importa

Numa conversa no aniversário de Camila e Tina, o Rafa falou do salto qualitativo que os Los Hermanos deram do primeiro pro segundo disco, de como o terceiro também é lindo... Eu concordei na hora, penso a mesma coisa. Pablo, do alto de sua vasta cultura musical, falou que os barbudos ainda não o convenceram, que a estética e os temas abordados nas letras não o agradam... Iniciou-se uma pequena discussão que foi encerrada na resposta exaladora de sarcasmo de Karla ao meu inocente argumento, que os Los Hermanos fazem muito bem o que se propoem a fazer. "O É o Tcham também", retrucou a jovenzinha.

Jogando xadrez aprendi a reconhecer a derrota, e a não prosseguir com o jogo por puro orgulho de não desistir. Voltei-me para a cerveja, e antigas reflexões sobre moda e bandas incensadas vieram a tona. Lembrei-me de Paulo Moita, em 99, falando que hoje em dia os burguesinhos gostam de Nirvana e Planet Hemp, que ele gostava nas antigas e agora não ouvia mais.

É um fenômeno curioso, presente em qualquer estilo. Um artista, de repente, estoura. Sua música toca a exaustão nas rádios, seu clipe vai para o disk MTV. Muita gente passa a consumir o trabalho da nova celebridade. A imprensa especializada se derrama em elogios. Os antigos fãs do cara se gabam de já o conhecerem há anos, quando ele não era ninguém.

Já o povo mais ligado em música, que já passou incontáveis horas ouvindo grandes artistas e já viu esse fenômeno se repetir várias vezes, costuma reagir de forma inversa. Falam que o que está fazendo sucesso é um lixo, que o êxito se deve ao bom marketing que fizeram pra ele, e se o cara for antigo, que ele era bom nos anos 70. Ocorre também de fãs o renegarem porque ele estourou. "O cara se vendeu", dizem.

Boa parte da população é feliz seguindo modas. São rotulados de alienados, sem personalidade, por aqueles que não seguem. O curioso é que muitas vezes os que não seguem modas são influenciados por elas na mesma proporção, ao enfiarem na cabeça que o que está na moda é ruim, antes mesmo de parar pra escutar a obra. Quando o fazem procuram defeitos para justificar a opinião pré-concebida.

Nesse jogo, a obra se perde. Os que gostam o fazem muito mais pela influência da moda, e o mesmo ocorre com os que não gostam. Com o julgamento turvado por essa elegante senhora, fica difícil entrar na viagem do artista. Que no fim das contas, é o que realmente importa. A elegante senhora, aparentemente imortal, já tem poder demais. Acho que não devemos dar a ela ainda mais, seja aceitando de bom grado a moeda que ela nos joga, seja recusando "inteligentemente". Basta olhar a moeda com clareza, e decidir se ela merece ou não entrar para sua coleção.

Saturday, November 06, 2004

Meu quarto, meu reino, minha prisão

No lugar onde passo a maior parte do tempo
Onde o cheiro do cinzeiro incomoda os de pulmão limpo
Eu decolo e flutuo... como uma águia
Pelos ares contidos em objetos pequenos

Em meio ao caos dos discos, livros e revistas
Amigos reais e virtuais me visitam, me alegram
A dois passos da minha cama acesso o mundo
Através do meu brinquedinho mais moderno

Tão perfeito é o meu reino que eu não preciso sair dele
Tem comida num estado vizinho, banheiro num estado próximo
Nele ouço o que quero, leio o que quero, converso com quem quero
Escrevo o que quero, para quem quiser ler

Dessa forma, aprisionado pela perfeição do reino
A vida passa lá fora, com mil cores que deixo de ver
Embriagado que estou pelos estímulos que manuseio
Saio da rota de milhares de coisas que talvez eu devesse viver

Thursday, October 28, 2004

Dissecando o Descontrole

Ah, os momentos em que a calma me abandona
E com ela meu livre-arbítrio, pois passo
a reagir instintivamente aos estímulos; e meu instinto
pode ser muito agressivo, mesmo com pessoas que gosto

Não sei precisar as causas disso. Mas seu efeito
já gerou muito ressentimento em pessoas que me são preciosas
E quando a calma volta, traz de volta opções de reação mais adequadas
Mas não traz de volta o momento em que eu deveria ter agido de outra forma

O remorso que me invade é proporcional ao descontrole
Tento encontrar justificativas e consigo
Me agarrar nas minhas mentiras para não me afogar no mar de culpa
E nadar lentamente de volta à tranquilidade

A inteligência que me permite perceber isso
É a mesma que me castiga, ao me levar por este caminho
É a mesma que diverte e encanta através das palavras
E também pelas palavras, fere, magoa a muitos...

...Inclusive a mim.

Saturday, October 23, 2004

Da parlosidade

Desde que o homem desenvolveu a linguagem que a pala é um importante instrumento para a realização dos seus desejos. Entenda-se como pala qualquer ocorrência verbal que visa a obtenção dos desejos do parloso. Muitas vezes a pala está associada à mentira, mas nem sempre isso é verdade. De vez em quando a pala é uma verdade, contada de forma tal que leve o ouvinte a fazer ou pensar o que o parloso deseja.

Existem vários tipos de pala. A pala sedutora, também conhecida como "cascata", visa atrair o sexo oposto (ou o mesmo sexo, depende da opção do parloso). A pala financeira objetiva alguma vantagem com o dimdim, seja para pagar menos no ra-rá da conta do bar, conseguir dinheiro emprestado ou mesmo protelar o pagamento do empréstimo já concedido. Tem a pala fanfarrona, onde se desperta a crença nos ouvintes de qualidades ou posses inexistentes no parloso. Já a pala "instinto de liso" visa receber algo de valor desprezível. A pala "advocacia" tenta limpar a barra de um amigo, ou de qualquer um que pague, no caso dos que exercem a profissão. Como se pode ver, a quantidade de tipos de pala é proporcional à pluraridade dos desejos humanos.

O parloso de boa índole, o bom malandro, se vale das palas para benefício próprio, sem prejudicar os outros. Mas há também os parlosos mau-caráter, que usam a pala de forma nociva. Difamação, intrigas, calotes: nessas áreas o parloso canalha tem prazer especial em atuar. Mas não podemos nos esquecer que a pala é um instrumento. Da mesma forma que não faz sentido ser contra a faca por ter gente que a usa para matar em vez de cortar o bife, também é ilógico opor-se à pala pelos patifes que a usam de forma vil. Portanto, viva a pala proferida pelos bons parlosos!

Sunday, October 10, 2004

Semente de Maçã

O frio na barriga da paixão ainda nascente
Me embaça o olhar, as idéias e o conforto
Inquieto, mentalmente te busco
E te encontro sorrindo... apagando tudo ao meu redor

Ouvindo uma melodia qualquer, o violão na mão
Tento libertar meu pensamento de você
Mas ao tocar as cordas eu imagino os seus cabelos...
E a música resultante sequer arranha sua soberania na minha mente

Por fim te encontro, do mesmo jeito que minha memória te guardou
Dividimos idéias, sorrisos e discordâncias
Não sinto a menor vontade de te mostrar que está errada
Sabendo que corro o risco de ao ganhar a discussão, perder o seu afeto

Mesmo assim, sem querer, falo algo que te desagrada
A conversa é encerrada sem que eu entenda o motivo
Meu olho tira a última foto e eu deslizo para longe do seu olhar
Para perto de outras galerias onde eu poderia me distrair...
... Se o quadro do teu rosto não ofuscasse todos os outros.

Saturday, September 25, 2004

Paranóico Esclarecido

Pare, pense, perceba
Transformações multiplicando-se silenciosamente
Por debaixo do véu da normalidade estática
Conspirações definem o destino de milhares
E ao se dar conta da verdade, você é levado ao psiquiatra

O vermelho na paisagem lhe lembra o sangue dos muitos
Que tiveram a existência encerrada sem nenhum motivo aparente
Todos mentem... o tempo todo; E a mentira torna-se verdade
Difundida pela imprensa, contestada por "lunáticos"

O mundo sangra, implorando por clemência
Como uma mãe tendo o ventre perfurado pelo filho
Toda a moralidade que supostamente seguimos é estilhaçada todos os dias
As tragédias constantes tornam-se estatísticas frias

E num quarto escuro, num prédio qualquer
Ele se diverte procurando mensagens ocultas
Sua coerência incontestável convence apenas o seu psicólogo
O resto da humanidade está vacinada contra a sua verdade

O que torna as coisas mais divertidas para ele
Rindo dos tolos fantoches, ele se isola em sua superioridade
Ampliando seus conhecimentos para se livrar da manipulação...
Ele prossegue descascando as infinitas camadas da conspiração

Ele pode vir a ser o salvador da humanidade
Ou mais um que não deixou sua marca na vida
Talvez justamente por não deixar marcas ele vá muito longe...
E ninguém jamais ficará sabendo

Wednesday, September 15, 2004

O 11 de Setembro Russo

A capa da Veja foi chocante. Uma mãe acariciando o rosto da filha morta, com a outra mão no pescoço, posando para a tragédia. Ao ler a reportagem, o choque aumenta. O 11 de Setembro Russo foi revoltante, pela pouca idade dos alvos. Pela brutalidade dos terroristas, que atiraram pelas costas nas crianças que estavam conseguindo escapar. Pela truculência do governo russo, para o qual o sacrifício de civis é menos importante do que os interesses do Estado.
A revista diz que o terrorismo é o grande inimigo do mundo civilizado. O problema é que o terrorismo nada mais é do que uma reação dos oprimidos aos opressores, ao "mundo civilizado". O terrorismo é injustificável por matar civis aleatoriamente. Mas as mortes provocadas pelo mundo civilizado, por interesses econômicos, militares, são justificáveis ?
Uma consequência curiosa desse atentado foi a aproximação entre Bush e Putin, entre as antigas nações rivais, que num passado recente dividiam o mundo. O massacre ocorreu quando estamos perto das eleições para presidente nos EUA. Sem dúvida fortaleceu Bush e sua plataforma anti-terrorismo. Também é curioso que os EUA há anos têm agentes da CIA na Chechênia, apoiando movimentos separatistas. E foi justamente um grupo separatista, com a ajuda da Al Qaeda, que realizou o atentado.

Saturday, September 04, 2004

Cumprimento da Profecia

A tempestade moveu as pedras antigas
Utilizadas em rituais xamânicos
Por aqueles que nossos ancestrais dizimaram
Antes da morte, um último encanto foi lançado
Permaneceria engatilhado por séculos
Até que o deslocamento das pedras o disparasse

Os que tomaram peyote naquela semana
Tiveram a premonição do cataclisma
Entidades que o tempo não diminuiu o ódio
Por terem sido privados da terra, da vida
Despertaram para o cumprimento da profecia

As tragédias começaram... nos quatro cantos do planeta
Líderes mundias com medidas desesperadas
Tentavam inutilmente conter o avanço do caos
Os paranóicos passaram a ser levados a sério
E migraram dos consultórios psiquiátricos
Para a redação de jornais e revistas influentes

Os cultos multiplicaram-se, com suas promessas de salvação
E o dinheiro resultante era investido na segurança de seus pastores
No entanto, por mais alto que se erguessem os muros
E mais blindados que fossem os carros
A proteção era frágil, como um tanque de porcelana
De nada valeu quando a conta de tantas mortes teve de ser paga

A Natureza estava do lado dos Antigos
Que sabiam conviver harmonicamente com ela
As feras escaparam dos zoológicos
Logo após a eficiente campanha do desarmamento

Saciada a sede de justiça
As Entidades puderam desfrutar da paz
Da humanidade restaram apenas os altamente insanos
E o mundo jamais presenciou tamanha felicidade

Friday, September 03, 2004

Explodindo Calado

Ah, se você percebesse...
Se eu fosse capaz de te fazer perceber
O que explode dentro de mim
Se algum estilhaço pudesse te acertar
Te arranhando bem de leve a nuca
Te arrepiando e te fazendo amolecer...

Mas eu, prisão inviolável
Absorvo a explosão
E a fumaça que sai é apenas a do cigarro
Com o interior em cacos
Te olho do mesmo jeito
Indecifrável pra você

Nem tanto a timidez
Nem a falta de jeito com as palavras
Mais o medo de te perder
Mesmo sem te ter
Melhor ir explodindo calado
Na esperança da prisão se romper

Thursday, September 02, 2004

Burguês Preocupado com o Social

A janela que me conecta com o mundo
Faz muito barulho ao abrir e fechar
Com receio de no meio da noite alguém acordar
Eu abafo seu ruído com a habilidade do meu punho

E deitado me deixo levar
Pelas imagens que a mente me apresenta num segundo
Me coloco no lugar de quem mora em local tão imundo
Imaginando o que vem em sua mente ao deitar

Talvez ele tenha o mesmo comportamento
Se deixa absorver, ainda que só por um momento
Pelas alegrias que sentiria ao estar no meu lugar

No entanto, terminado o devaneio, ao pisar no cimento
Ele volta pra sua realidade e seu eterno lamento
Equanto eu, com os pés na cerâmica, volto pro meu eterno desfrutar

Monday, August 16, 2004

E assim caminha a humanidade

A brisa da praia, a água de coco gelada
O coco que caiu a poucos metros do senhor que jogava dominó
Senhor que minutos antes ignorou o menino no sinal
Menino que gostaria de estar na praia, tomando água de coco

Uma embalagem de barra de cereal no chão
Jogada por uma jovem integrante dos vigilantes de peso
A entidade que recusou inúmeras propostas de marketing de um chocolate "light"
O mesmo chocolate que é recomendado em uma das inúmeras dietas

Dietas concebidas por pessoas de colesterol alto
Que gostam de ficar na praia, comendo cereal e tomando água de coco
Pensando na nova idéia "revolucionária" com que enganaram as pessoas
Pessoas que estão preocupadas demais com o cereal e a água de coco para pensar de volta.

Tuesday, August 10, 2004

Tava lendo numa Superinteressante antiga (janeiro de 2003) uma matéria sobre deliquência juvenil, alavancada pelo caso Suzane von Richthofen, aquela que planejou e executou o assassinato dos próprios pais, junto com o namorado e o irmão deste. Interessante como a opinião pública fica chocada quando as atrocidades são cometidas por pessoas de classe média pra cima. A violência dos pobres, dos sem perspectiva, já é esperada e não passa de estatística, quando a vítima é outro pobre. Quando a vítima é da classe média, gera comoção e indignação, como no caso das meninas em Serrambi.

Mas quando os criminosos são da classe média ou alta o quadro é outro. Todos ficam chocados, perplexos. Logo se levanta a possibilidade de insanidade (que alivia muito a sentença), o que quase nunca ocorre nos crimes da "ralé". Como se só os ricos tivessem o direito de ser loucos. Especialistas explicam que a predisposição à violência pode ser uma questão genética, que 1 em cada 100 pessoas apresentam o tal defeito de fabricação, mas só 1 em 1 milhão tem tendência à violência extrema... Outros apontam as falhas na educação desta juventude, que teve tudo permitido e nada negado, e por isso não tem noção de limites, respeito pelos outros ou aspirações além da satisfação pessoal.

Enquanto isso, mais e mais corpos vão pra vala, neste universo paralelo ao nosso, a alguns quilômetros de nossas casas. Os jornais estamparam a cara das meninas em Serrambi, enquanto a cara da menina morta na favela foi estampada com jornais. Mas a opinião pública não se chocou, comoveu ou indignou com este último caso. A maior parte nem tomou conhecimento e os que tomaram, nos 30 segundos dedicados a ela no Cidade Alerta, não distinguiram a árvore anônima em meio a floresta das tragédias. Até porque a floresta é oferecida todos os dias, pontualmente, perto da hora do jantar.

Monday, August 09, 2004

Milagres Humanos

Aquele ímã na geladeira que você nem repara ao abrir a porta
Lhe dá uma sensação familiar, quando registrado pelo inconsciente
Faz com que aquele congelado pareça a comida feita na hora pela sua avó
Assim são os pequenos detalhes que o olho fotografa e a consciência não revela

Tentam adivinhar pra onde vai essa geração sem rumo
Pingando em plantas ilícitas, arte rebelde e filosofia fast-food
A geração que não sente o conforto dos detalhes não revelados
Porque o frenesi dos estímulos destruiu a delicada câmera

A geração que agora se encontra sem forma
Como a água de uma garrafa ao ser jogada no chão
Tanta luta por liberdade... e quando enfim ela é conquistada
Percebe-se o quanto é difícil servir-se da água sem algo que a contenha

Um copo, uma garrafa, um rio, um mar
Todos tem um contorno que delimita sua extensão
Sem este contorno a água se espalharia indefinidamente
Como acontece com essa geração

E então os especialistas recomendam educações mais rígidas
"Deve-se impor limites, não ter medo de dizer não"
Afogando os pais em culpa quando um filho tem problemas com drogas
Os mesmos pais que seguiram os especialistas da época
Quando estes diziam quase o oposto do que é falado hoje

Talvez o problema seja a necessidade de fórmulas mágicas
O milagre do microondas, que transforma um congelado quase estragado num jantar
Transformaria fetos em pessoas felizes e produtivas

Mas parece que a natureza não liga muito para os "milagres" humanos
E por mais sofisticadas que sejam as técnicas de jardinagem
Algumas plantas insistem em apresentar anomalias

Sunday, August 08, 2004

Beleza Depressiva

Os livros de auto-ajuda se amontoam nas estantes
Para ela poucas coisas são mais irritantes
Do que a pena cristã, gratuita e narcisista.

Ela sente pela rua o olhar das pessoas
Ela sabe que mesmo sendo pessoas boas
A olham como se fosse um gato prestes a ser atropelado em plena pista.

Ela não é anarquista, socialista ou capitalista
Ela não é culpada pelas várias vidas destruidas
Ela é absolvida por ser muito bonita.

Já está cansada de em vários despertar a paixão
Cansada de assistir o fogo virar comiseração
Quando tomam consciência de que é uma garota depressiva.

As vezes ela sonha em viver num paraíso pagão
Onde olhará as pessoas nos olhos e elas não hesitarão
Em devolver-lhe o olhar com a clareza que necessita.
Nessas quase duas semanas que tive de férias, assisti a 6 filmes: Dois no cinema e o resto em DVD. Aí vão algumas humildes impressões que tive dos filmes.

  • Tróia: Legal, pela história, pela reconstituição de época, pela mulher que interpreta Helena. Em alguns momentos os diálogos são bobos, abusam dos clichês e algumas cenas de luta são confusas. Apesar disso me proporcionou um bom divertimento.
  • Homem Aranha 2: Legal, mas eu esperava mais. A ação demora pra engrenar e mais uma vez temos diálogos bobos. Ocorrem algumas incoerências em relação às HQs, como a parte em que Peter Parker tira a máscara ao tentar salvar um trem. Preferi o primeiro, mas este também é um bom filme.
  • Quanto Mais Quente Melhor: Muito bom. Engraçadíssimo. Dois músicos desempregados acabam testemunhando um assassinato de gângsteres e tornam-se alvos da máfia. Para escapar, se disfarçam de mulher e viajam com uma banda feminina. Lá conhecem uma cantora, interpretada pela Marilyn Monroe, e passam por situações engraçadíssimas. Ótimos diálogos e atuações, vale a pena mesmo. Em muitas cenas, só de olhar pra cara do Jack Lemon dá vontade de rir.
  • Rashomon: Do diretor japonês Akira Kurosawa, narra a morte de um samurai (a estória se passa no Japão medieval) e o estupro de sua esposa de quatro formas diferentes. As versões dos três envolvidos (o samurai morto conta sua estória através de um médium) e a de uma quarta pessoa que testemunhou o incidente. A idéia central é como diferentes pessoas enxergam o mesmo fato de maneiras diferentes, de acordo com a própria personalidade. Gostei muito, mas demorou um pouco pra capturar minha atenção. Deve ser a influência das mega produções de Hollywood em minha pobre cabeça aculturada.
  • Crepúsculo dos Deuses: Extraordinário. Muito, muito bom. Do mesmo diretor de "Quanto mais quente melhor", Billy Wilder este drama versa sobre uma grande estrela do cinema mudo, que foi esquecida com o advento do cinema falado e se recusa a aceitar isso. Com 50 anos, ela vive num delírio espelhado em quando estava no auge, com 25 anos. Foi o que eu mais gostei de todos esses filmes.
  • O Homem que Matou o Fascínora: Clássico do velho oeste, este filme conta a trajetória de um pacífico advogado, que chega numa cidade onde a lei em vigor é a lei do revólver. Este filme me apresentou o John Wayne, "o maior astro que já apertou um gatilho", que era o Mel Gibson de "Máquina Mortífera" da época. Muito divertido.


Saturday, July 31, 2004

Coisa curiosa aconteceu aqui em Salvador. Uma baleia encalhou e morreu aqui pertinho da casa do meu pai. 15 metros e 30 toneladas. Ela encalhou num dia e eu fui urubuservar no dia seguinte. Já tinham recolhido boa parte da coitada, mas o pedaço que restou ainda era imenso. O sangue continuava a tingir o mar de vermelho. Desconfio que o fedor (insuportável, dava pra sentir a vários metros de distância) me provocou uma tosse crônica, daquelas que a barriga dói. Os cigarros contribuiram um pouco, é claro, mas o principal foi o fedor da baleia. Como disse Nonato, eu devo ser alérgico a fedor de baleia morta.

Como era de se esperar, vários curiosos como eu observando a catástrofe. A tragédia sempre desperta atenção, e as dimensões do bicho amplificaram o fenômeno. Prejuízo para os quiosques, pois embora houvesse muita gente no local, ninguém em sã consciência pararia pra tomar uma cerveja com aquele fedor. Manchetes para os jornais, estudo para os biólogos e um espetáculo raro para os demais. Sem filas, sem ingressos e sem tristeza. Para um povo acostumado a ver mortes diariamente nos jornais, a morte de uma baleia nada representa.