Wednesday, December 13, 2006

Racionalização

A notícia não poderia ser mais noticiável: “Garota reage e mata estuprador” (Capa do Diário de Pernambuco, de 12/12/06). Sexo, sangue e singularidade, os três esses do sucesso, também do Six Six Six, the number of the beast, pra adequar a viagem aos meus leitores metaleiros. Confesso que fiquei com uma simpatia enorme pela menina. Que coragem! Em casos de estupro, eu concordo com o filósofo Jeremias, (http://www.youtube.com/watch?v=87xcp4FeQSI) quando declara que “quem é safado tem que morrer”, e quando a execução é feita em legítima defesa pela vítima.

Até os próprios bandidos repudiam estupradores, de acordo com os Racionais Mc´s (http://www.box.net/public/uoo2p27mzm), grupo de rap que faz da violência o grande tema de suas letras. Para mim, burguês metido a mala, ouvir Racionais foi daquelas experiências inesquecíveis, um universo que eu precisava conhecer, irresistivelmente. Eu conseguia enxergar, naquelas letras retratando a bandidagem, a indicação de outros caminhos que não o crime. Ao dissecá-lo, coisa que fazem muito bem, Mano Brown e Cia mostram que ele não vale a pena, apesar das vantagens imediatas que oferece – o preço pago é alto demais, e a cobrança vem mais cedo ou mais tarde. Eu acreditava que, se os bandidos em potencial ouvissem Racionais, aquilo os faria parar pra pensar, e possivelmente optar por ficar longe do crime.

Não fiz nenhuma pesquisa de campo para comprovar minha teoria. Mas, no Acaiaca, onde volta e meia o galego que vende cd pirata coloca Racionais pra tocar, noto que os “elementos suspeitos” cantam com especial prazer o refrão “hoje eu sou ladrão/pratico 157/as cachorra me ama/os playboy se derrete”. (http://www.box.net/public/9lad39fuez) O protagonista da letra morre no final, e Brown recomenda estudo e distância do crime à molecada da favela, mas ainda não vi ninguém nem cantar, quanto mais se empolgar com essa parte. Isso me fez repensar minha teoria.

Ouvir Racionais, por um lado, dá uma certa “credibilidade das ruas” ao ouvinte burguês, ou pelo menos é isso que ele acha: imagina o bandido vindo assaltar o “burguês-mala” e ele tentando se defender com um “pera ae mano, eu ouço Racionais!”. Provavelmente ouviria um “Ah é? Então canta Capítulo 4 Versículo 3 (http://www.box.net/public/i7sska1pau) enquanto eu te deixo de cueca!” (alguém aí lembrou do grande Boça, de Hermes e Renato? :D). Certo, esse parágrafo não tem nada a ver com a teoria, mas é que eu achei a piada boa e não encontrei lugar melhor pra ela. A coisa volta a ficar séria no próximo.

O problema é que o lado construtivo das letras dos Racionais, e aqui eu faço uma extensão a todo hip-hop que retrata a bandidagem, pode se diluir na exaltação da vida do crime. As letras em primeira pessoa encarnam criminosos, eles acabam se estrepando no fim, muitas vezes arrependidos. Mas o cara que ta pensando em ser bandido vai escutar bem alto a saga criminosa e bem baixo a lição final, de acordo com minha insuficiente amostragem do Acaiaca.

Claro que, dentre as variáveis que levam ao crime, a (distorcida) recepção das mensagens dos Racionais não deve ter grande peso. Pobreza, apelos do consumo e ostentação são os lutadores de sumô, no caso. Mas não dá pra deixar de notar que os crimes vêm ficando mais violentos. Hoje mesmo aconteceu outro assalto com ferido, na Av. Boa Viagem. Isso sem falar na cachoeira de sangue que despenca nas periferias e não ganha da mídia a mesma cobertura dos “sangue-azul”. E não dá pra deixar de notar que Racionais e outros hip-hops violentos têm se tornado cada vez mais populares. Alguma conexão entre os fatos? Só uma boa pesquisa de campo pode responder. Fica como promessa para quando a preguiça me abandonar.

2 comments:

Laura said...

Capitulo 4 versiculo 3...Até eu sei cantar, veja só.
Vim aqui cumprir meu papel de chata e reclamar que todos os seus textos terminam com um ar de arrependimento, ou preguiça, e nenhuma tentativa de mudança.
Tentativa é diferente de promessa, viu, moço?

Anonymous said...

tá certo! se fosse eu faria a mesma coisa.

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