Wednesday, May 23, 2007

Idéias Próprias

Lembro-me de uma versão para videogame do desenho Beavis and Butthead. Quando você ficava muito tempo sem movimentar o personagem, surgia um balão de pensamentos, daqueles de histórias em quadrinhos, completamente vazio. Uma imagem perfeita para “não ter nada na cabeça”. A principal maneira de evitar esse vazio mental, todos nós sabemos, é através de boas leituras.

Mas não é bem assim. De acordo com o professor Rubem Alves, na sua coluna na Folha de São Paulo, o excesso de leitura pode fazer com que a pessoa deixe de pensar por si própria. Ele conta o caso de quando selecionava candidatos a doutorado, e teve a idéia de fazer uma única pergunta a todos eles: “Fale-nos sobre aquilo que você gostaria de falar”. Os candidatos entraram em pânico, não sabiam o que responder. Uma mulher chegou a citar várias partes de um livro da bibliografia obrigatória, achando que a pergunta era uma brincadeira.

A idéia é que, ao ler, estamos acompanhando o pensamento de outros. Se passamos a maior parte do tempo lendo, a menor parte do nosso tempo é dedicada a nossos próprios pensamentos. A conseqüência é que nossa mente fica habituada a papaguear pensamentos alheios, enquanto nossas idéias próprias são pouco produzidas, tendendo a desaparecer.

Uma questão interessante é: até onde nossas idéias são de fato “nossas”? Mesmo aquelas a que chegamos não por leituras, mas pelos “próprios méritos”. Existe o provérbio que afirma: “Do nada, nada sai”. Se tivéssemos acesso ao processo mental que levou àquela idéia original, veríamos que ela caiu do céu como um raio de inspiração, ou que foi fruto do trabalho mental, que lida com elementos preexistentes, saberes anteriormente adquiridos de algum modo, seja leitura, experiência, filmes, discos, conversas...? Ou será que ela irrompe desse subterrâneo a que não temos acesso direto, que é o nosso inconsciente?

Sobre a questão da originalidade, vale a pena conferir a tira do Arnaldo Branco.

4 comments:

Laura said...

Que coincidência tu ter escrito isso...Quando tu entrar no msn te explico.

Anonymous said...

Rubem Alves é um dos caras menos blasé que existem na face da terra - quase um monge dos grotões mineiros. O texto dele tem uma simplicidade que comove sem ser piegas, além de ser bastante inspirador - vide o texto do nosso amigo Bernardus.
Domingos

Anonymous said...

Muito bom!
Qual a diferença entre informação e conhecimento? O que é sabedoria?
Acho, sinceramente, que estas questões têm tudo a ver com a idéia apresentada.

Gosto muito de Rubem Alves.

Silvio.

Bernardo Jurema said...

boa reflexão. se te interessar, tem um livro (ser ou ter?) em que Erich Fromm trata justamente da diferença entre isso que você falou, ao contrapor o "modo ser" ao "modo ter", e ele ainda leva isso além, para o campo das emoções.